Revista de Medicina Desportiva Informa Novembro 2019 | Page 32
alimentares a aplicar até às 48 horas
seguintes ao esforço. São conhecidos
os 3 R’s da recuperação: reidratar,
reabastecer (o glicogénio muscular) e
reparar (o tecido muscular).
A reidratação deve iniciar-se ime-
diatamente após o fim do esforço, se
não ainda durante o esforço, sobre-
tudo se as perdas de água forem
superiores a 2% do peso corporal. 1
Para além de repor a água perdida
pela sudação, a reidratação adequada
permite também otimizar a reposi-
ção de glicogénio muscular e síntese
de proteína no músculo. Por cada
quilograma perdido deve ser ingerido
1,5L de água/líquidos. No entanto, se
a reidratação for feita apenas com
água, pode aumentar até três vezes
o tempo necessário para restaurar
volume plasmático. 2 As bebidas com
0,46 a 1,15g de Na/L promovem maior
absorção de água intestinal e ajuda-
ram a manter o volume extracelular. 3
Para a reposição de glicogénio
no músculo após esforços inten-
sos recomenda-se a ingestão de 8
a 12g de hidratos de carbono (HC)
por quilograma de peso corporal
por dia. 4 Em caso de necessidade
de uma recuperação mais rápida, a
ingesta de HC recomendada é de 1,2
a 1,5 g/kg/h. Apesar de não ser ainda
totalmente claro, recomenda-se a
preferência por HC com absorção
mais rápida (açúcares ou amidos
refinados). A ingestão de proteína
(cerca de 20g), sobretudo quando a
ingesta de HC é inferior a 0,8g/kg/h,
acelera a ressíntese de glicogénio no
músculo, assim como a ingestão de
cafeína (3-6mg/kg). 5 No entanto, o
uso da cafeína deve ser ponderado,
em particular por poder interferir
com o descanso noturno do atleta.
No que respeita à recuperação do
músculo após esforços, nomeada-
mente exercícios de força resistente,
recomenda-se a ingestão de 20 a 40g
de proteína, em particular as que
contenham os aminoácidos essen-
ciais. 6 Não existe propriamente uma
“janela anabólica”, de curta duração,
já que a síntese de proteína no mús-
culo se pode manter aumentada até
24h após o esforço. Assim, durante o
período de recuperação, deve manter-
-se a ingestão regular de proteína
(cerca 20-25g a cada 3-4 horas) como
forma de estimular a síntese proteica
no músculo, o que permite a sua
reparação e/ou adaptações ao treino. 7
30 novembro 2019 www.revdesportiva.pt
Como parte das estratégias nutri-
cionais de recuperação, surgiu nos
últimos anos algum interesse por
duas substâncias: o tart cherry (TC)
juice (sumo, concentrado ou não, de
cerejas Montmorecy) e o bicarbonato
de sódio. Quanto ao TC o interesse
advém do seu teor de polifenóis e
flavonoides, em particular das anto-
cianinas e catequinas. Estes nutrien-
tes podem reduzir a dor reportada,
os marcadores de inflamação e
stress oxidativo, melhorando tam-
bém o sono. 8 No entanto, o seu uso
não deve ser aplicado nas fases de
treino onde se trabalham as adap-
tações. Quanto ao bicarbonato de
sódio, trata-se de um tampão, cuja
utilização visa reduzir o tempo de
recuperação e/ou aumentar a capa-
cidade de realizar séries repetidas
de exercícios. No entanto, a revisão
de bibliografia ainda não deixa claro
para que tipo de exercícios e respe-
tiva duração, a suplementação com
NaHCO 3 pode ser útil. 9
A finalizar, importa ainda referir
que as estratégias nutricionais de
recuperação devem ser adaptadas em
função de diversos fatores: o tempo
disponível para a recuperação, as
estratégias de recuperação concomi-
tantes (higiene do sono, crioterapia)
e as preferências e adesão do atleta.
Assim, deve trabalhar-se na educação
do atleta com vista à adoção de uma
boa base alimentar, com cuidados
alimentares específicos para os perío-
dos antes, durantes e após o esforço,
deixando a utilização de suplementos
alimentares como ferramenta de
precisão para eventuais ajustes finais
que sejam necessários.
Bibliografia
1. Maughan RJ, Shirreffs SM. IOC Consensus Con-
ference on Nutrition in Sport, J Sports Sci. (2011)
2. Shirreffs SM, Sawka MN. Fluid and electrolyte
needs for training, competition, and recovery. J
Sports Sci. 2011
3. Nieves Palacios Gil-Antuñano et al. Consensus
on drinks for the sportsman. Composition and
guidelines of replacement of liquids. FEMD (2008)
4. Kerksick et al., ISSN position stand: nutrient
timing. J Int Soc Sports Nut. (2017)
5. Betts JA, Williams C. Short-term recovery from
prolonged exercise: exploring the potential for
protein ingestion to accentuate the benefits of
carbohydrate supplements. Sports Med. (2010)
6. Witard OC et al., Myofibrillar muscle protein
synthesis rates subsequent to a meal in
response to increasing doses of whey protein
at rest and after resistance exercise. Am J Clin
Nutr. (2014)
Prof. Doutor Francisco
Tavares
Coordenador de
Performance do Sporting
Clube de Portugal
As adaptações ao treino são depen-
dentes do equilíbrio entre o estímulo
de treino e a recuperação. No pro-
cesso de recuperação, a alimentação,
a hidratação, o sono e a periodiza-
ção das cargas de treino são áreas
reconhecidas como sendo os pilares
para que os atletas tenham respostas
positivas ao treino. Se na maior parte
dos cenários os atletas conseguem
recuperar naturalmente através des-
tes pilares, em alguns períodos onde a
densidade de treino ou a competição
são maiores pode ser pertinente utili-
zar modalidades que possam ajudar
a acelerar o processo de recuperação.
Entre as diversas modalidades que
existem, a crioterapia assume princi-
pal protagonismo no que diz respeito
à literatura científica publicada e à
utilização no terreno, sendo os banhos
de gelo e os banhos de contraste
entre frio e calor os métodos mais
implementados no mundo do treino.
Ainda que os mecanismos não sejam
conhecidos na totalidade, a criotera-
pia diminui a temperatura da pele, do
core e dos músculos, levando a vaso-
constrição e consequente diminuição
do edema e inflamação derivados
do dano muscular. Os efeitos agudos
que têm sido verificados são bastante
controversos, variando os resultados
entre a ausência de quaisquer efeitos
até efeitos benéficos ao nível das
dores musculares, do desempenho
neuromuscular e do dano muscular,
em períodos de tempo que variam
essencialmente entre as 12 e 72 horas.
Entre outros fatores, as diferenças
no nível de prática dos sujeitos, nas
características dos sujeitos avaliados,
no estímulo utilizado para causar
fadiga, nos protocolos de crioterapia
e nos testes utilizados para verificar a
eficácia das estratégias de crioterapia
parecem contribuir para as diferenças
nos achados.
Sendo a inflamação um processo
importante na mediação das vias de
síntese proteica, existe uma corrente
de investigação que se preocupa com