Revista de Medicina Desportiva Informa Novembro 2017 | Page 16
manual, mobilização articular
passiva, estiramentos musculares
(inclusivamente do braquial), forta-
lecimento isométrico e excêntrico
progressivo, assim como treino
propriocetivo do membro superior
afetado. Este programa foi acompa-
nhado de treino diário em ginásio
para preservar flexibilidade, força e
condicionamento aeróbio.
Quinze dias após a lesão, a atleta
estava capaz de competir no Cam-
peonato do Mundo, embora ainda
com restrição de 10º na extensão do
cotovelo, assim como com contra-
ção isométrica dolorosa do músculo
braquial. A competição decorreu
sem intercorrências, a atleta treinou
e competiu com recurso a tapping
para estabilização da articulação,
analgésico para o quadro doloroso
e manteve durante este período o
plano de reabilitação proposto.
Após a competição recomeçou o
programa de reabilitação na fase
inicial, com repouso articular, pro-
gredindo no plano anteriormente
instituído com complexidade pro-
gressiva.
Quarenta e cinco dias após a lesão,
a atleta recuperou a amplitude
total do movimento articular, tinha
função muscular normal e retomou
atividade gímnica sem restrições e
sem dor, apresentando, no entanto,
uma longa massa de consistência
pétrea, móvel, no músculo braquial.
Realizou outra ecografia e RM, que
demonstraram presença de massa
óssea, sugestiva de miosite ossi-
ficante do músculo braquial com
2.3cm de largura, 2.5cm de diâmetro
Figura 1 – A ginasta, base prin-
cipal (inferior), a competir no
Campeonato do Mundo, 15 dias
após o aparecimento da lesão
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ântero-posterior e 6cm de compri-
mento (Figuras 2 e 3).
A atleta continuou a treinar,
mantendo os exercícios terapêuticos
anteriormente iniciados, optando-se
por uma abordagem conservadora da
MO. Iniciou tratamento com ondas
de choque extracorporais focais (três
sessões espaçadas de duas semanas,
a inicial com 500 disparos de baixa
a média intensidade e as seguintes
com 1500 disparos) associadas a
um plano de exercício, englobando
mobilização articular passiva e ativa
do cotovelo, fortalecimento muscular
do membro superior, assim como
estiramento progressivo e indolor do
músculo braquial. Oito meses após
a lesão, a atleta não apresentava
qualquer massa palpável, dor ou
limitação articular.
Discussão
Uma das principais complicações
das lesões musculares é a manu-
tenção do processo inflamatório
que conduz ao desenvolvimento de
tecido fibroso e de calcificação, que
está na origem da MO. 2 Os locais
mais frequentes de aparecimento
são adjacentes às diáfises dos ossos
tubulares, sendo o quadricípite
femoral e o músculo braquial os
músculos mais frequentemente
envolvidos. 1,4
Vários fatores de risco foram
associados ao aparecimento de
MO, entre eles a gravidade da lesão
inicial, existindo uma correlação
positiva entre esta e a probabili-
dade de desenvolvimento de MO.
O edema localizado de aparecimento
rápido na região lesionada, nova
lesão durante a fase de recupera-
ção, atraso na implementação do
tratamento superior a 72 horas,
abordagem incorreta do hematoma
muscular e o retorno precoce à ati-
vidade desportiva foram apontados
também como fatores de risco para
o desenvolvimento de MO. 1,2 Durante
os primeiros 15 dias após a lesão
muscular, o exercício intenso está
contraindicado pelo risco de agrava-
mento da mesma. 4,5
Relativamente ao caso clínico
anteriormente apresentado, pensa-
mos que a lesão inicial (hematoma
intramuscular) foi tratada corre-
tamente, mas consideramos como
fatores de risco para o aparecimento
de MO a não realização da aspiração
do hematoma e o retorno precoce à
atividade, nomeadamente à compe-
tição (15 dias após a lesão). 1,5
Após o desenvolvimento de MO,
esta foi abordada conservado-
ramente. Inicialmente a terapia
descrita para casos de MO era
baseada nos princípios do RICE,
repouso articular, gelo, compressão
e elevação, estiramentos e fortale-
cimento passivo não dolorosos. 1,4,6
Abordagens mais recentes demons-
tram a eficácia das ondas de choque
extracorporais associadas a treino
de fortalecimento e de flexibilidade
progressivos. 7 Pensa-se que o efeito
das ondas de choque deve-se à esti-
mulação de mediadores biológicos,
nomeadamente anti-inflamatórios,
que fomentam a reparação teci-
dular e o processo de regeneração
tecidular 1,2,7 , contribuindo assim
para a reabsorção da calcificação e
aceleração do processo de regene-
ração tecidular, sejam eles músculo,
tendão ou outro.
Mais estudos devem ser realiza-
dos sobre o impacto das ondas de
choque no tratamento da MO. No
entanto, vários casos clínicos foram
descritos, com sucesso, com esta
abordagem na MO, a maioria deles
baseados num estudo publicado
com 24 atletas. 7 Este estudo prospe-
tivo publicado em 2010 demonstra
a resolução clínica e funcional de
21 dos 24 atletas, com melhorias
estatisticamente significativas ao
Figura 2 – Ecografia realizada 45 dias após a lesão, mostrando múltiplas calcifica-
ções no músculo braquial em relação com hematoma parcialmente calcificado.