Revista de Medicina Desportiva Informa Novembro 2017 | Page 31

Caso clínico

Rev . Medicina Desportiva informa , 2017 , 8 ( 6 ), pp . 29 – 31

Reconstrução do Ligamento Patelofemoral Medial ( LPFM ) em Atletas de Competição .

Porquê operar após primeiro episódio traumático ? Como operar e como reabilitar ? A propósito de 4 casos clínicos .
Dr . Henrique Jones Médico ortopedista . Clinica Ortopédica do Montijo / Hospital da Luz Setúbal
RESUMO / ABSTRACT
O tratamento de um primeiro episódio de luxação traumática da rótula no jovem é discutível e controverso . Alguns investigadores advogam o tratamento conservador , enquanto outros sugerem desde logo a reparação do ligamento patelofemoral medial desde que as fises se encontrem encerradas . No caso dos atletas de competição , ainda que se manifeste como primeiro episódio , a nossa opção é cirúrgica ( sobretudo na presença de queixas de instabilidade anteriores ao episódio ), sendo que a nossa pequena amostra ( quatro atletas de diferentes modalidades desportivas ) confirma que a indicação rigorosa , a técnica cirúrgica adequada , a reabilitação por patamares individualizada e o cumprimento estrito dos critérios de regresso á atividade desportiva poderão ser decisivos na continuação dessa prática desportiva , sem recorrência de episódio inicial .
The initial treatment of patella dislocation in the youth is debatable and with controversy . Some investigators advocate the conservative treatment while others suggest immediate medial patellofemoral ligament reconstruction , in patients with physeal closure . In competitive athletes , even with a first episode dislocation , our option is surgery ( mostly in those who complained of previous instability ) and despite our sample is to short ( 4 athletes of different sports ) it confirms that a strict indication , an adequate surgical technique , a step by step individualized rehabilitation , and the strict compliance with the return to sports criteria could be crucial in sports practice continuity , without recurrent dislocation .
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Luxação da rótula , ligamento patelofemoral medial Patella dislocation , medial pattelofemoral ligament
Introdução
A história natural da luxação da patela não tratada , ou tratada de forma conservadora , origina novo episódio em um de cada seis casos , sintomas residuais em 33 % e ausência de sintomas em 50 %. 1 Em 25 % dos casos há história familiar de luxação da patela . O papel do ligamento patelofemoral medial ( LPFM ), como restritor primário da luxação patelar lateral , tem sido descrito por vários autores . 2
Os estudos em cadáver têm provado que esse ligamento atua bloqueando as forças laterais . A rotura está presente em oito de 10 casos de luxações experimentalmente produzidas em cadáveres e em 15 de 16 casos estudados in vivo . Davis e Fithian mostraram que a insuficiência desse ligamento é fator determinante para que a patela se torne instável ( 53-60 % entre 0-20 ° de flexão ), caso qualquer outro fator predisponente esteja presente . Este estudo demonstrou ainda que a laxidão lateral é restaurada com a reconstrução do LPFM . 3 Assim , para os indivíduos , sobretudo jovens , que apresentem um quadro de luxação recorrente da patela , após programa adequado de reabilitação , a reconstrução do MPFL é uma opção cirúrgica que tem vindo a impor-se como técnica de eleição , sobretudo em atletas , mesmo após o primeiro episódio , tendo por base a noção de que a luxação é impossível sem rotura do LPFM . 4 , 5
Características do ligamento
O conhecimento anatómico e biomecânico deste ligamento , descrito por Warren e Marshal 6 , trouxe resultados melhores e mais uniformes ao tratamento cirúrgico da luxação aguda
da patela . Trata-se de uma estrutura muito fina , muitas vezes ausente ( em 35 % dos casos 7 ), localizada no 2 .° plano anatómico medial do joelho , com um comprimento de cerca de 53mm e largura de 20mm , e formado por um duplo feixe , um superior e outro inferior , em forma triangular em vela de barco e com uma resistência de 208 Newtons ( Figura 1 ).
Técnica cirúrgica
A cirurgia decorreu sob raquianestesia , ou anestesia geral , com posicionamento em decúbito dorsal com membro em extensão na mesa operatória e garrote pneumático na raiz da coxa . Após recolha do tendão do músculo semitendinoso , por acesso de 2 a 3cm medial à tuberosidade anterior da tíbia , foi realizada incisão semelhante na face medial da patela , no terço proximal . Por essa abordagem foram realizados dois túneis com 3.2cm de diâmetro e 20-25 mm de comprimento no 1 / 3 superior da patela , com distância de cerca de 10mm entre eles e com objetivo de inserção de duas âncoras Raptormit 3.7 PLLA com o enxerto devidamente ancorado [ Figura 2 a ) e b )]. Após inserção das âncoras e teste de resistência , o loop foi passado sob o músculo vasto interno , entre a segunda e a terceira camadas do retináculo , sendo inseridos após realização de túnel e teste de isometria 8 , no local na região posterior e superior do epicôndilo medial , distal e anterior ao tubérculo dos adutores , através de parafuso interferencial em PEEK de 20-25mm e diâmetro variável de acordo com o enxerto , normalmente , a 60 ° de flexão do joelho [ Figura 3 a ) e b )].
Figura 1 – O LPFM – metade proximal do bordo medial da rótula , onde geralmente é sobreposto pelo músculo vasto medial oblíquo e inserção no fémur , imediatamente proximal ao epicôndilo
Revista de Medicina Desportiva informa Novembro 2017 · 29