Revista de Medicina Desportiva Informa Novembro 2012 | Page 12

referida em 40 % dos doentes 8 , mais frequente nos jovens , na mulher e na carência social .
A associação de deficites de mobilidade e disfunção cognitiva determina perda acrescida de função e qualidade de vida ( QV ), relativamente a outras patologias crónicas ( artrite , doença inflamatória intestinal ) 1 , 15 .
Prescrição de atividade física
A controvérsia Esta temática tornou-se mais visível em 1890 , quando o oftalmologista alemão Wilhelm Uhthoff relatou o surgimento de ambliopia , de instalação súbita , após a realização de EF 5 . Uhthoff concluiu que a AF era deletéria e a prescrição de EF tornou-se formalmente contraindicada . Na segunda metade do século XX , o agravamento sintomático após EF foi associado ao aumento da temperatura corporal induzido pelo exercício 16 . De facto , 60 – 80 % dos doentes com EM experimentam agravamento de sintomas neurológicos com o aumento da temperatura corporal ( ex . AF vigorosa , febre ou banho quente ) 5 . Este agravamento é temporário e a normalização 30 minutos após cessação do EF descrita em 85 % dos casos 17 . Alguns autores apontam fenómenos disautonómicos de desregulação da temperatura central e subsequente diminuição de velocidade de condução axonal ( temperatura-dependente ) em axónios parcialmente desmielinizados 18 . Atualmente , a evidência mostra que a temperatura cerebral e medular mantém- -se estável , mesmo durante o EF intenso 16 . A reação anormal ao calor terá etiologia multifatorial , com prováveis alterações circulatórias e humorais 8 . Também o argumento de que o “ desperdício ” de energia na prática de EF pode agravar a fadiga e reduzir capacidade para AVDs foi utilizado para contrariar a sua prescrição . O possível efeito deletério da AF em estruturas do sistema nervoso central ou aumento da taxa de surtos nunca foi demonstrado 1 , 19 . A falta de EF aumenta o deficite de FM e a fadiga . A inatividade tem um impacto negativo no estado de saúde dos doentes e contribui para a perda funcional 20 .
Tipos de atividade física O exercício terapêutico ( condicionamento aeróbio e fortalecimento muscular ) e a fisioterapia ( amplitudes articulares , atividade muscular , tónus , coordenação , equilíbrio ) são elementos terapêuticos incontornáveis na EM . São referidos 3 grandes objetivos inerentes à prática do EF , nomeadamente a maior facilidade na realização de tarefas , a manutenção ou aumento da condição física e o aumento da condição aeróbia 5 . Perto de 100 % dos doentes internados e 59 a 96 % dos programas domiciliários decorreram sem efeitos adversos ou intercorrências 5 , 22 , 23 , 24 , 25 .
O trabalho muscular decorre com a prescrição de exercícios de resistência progressiva , sendo habitualmente considerados 3 princípios operativos 26 . Decorre segundo um reduzido número de repetições até à perceção de fadiga , considera-se um tempo de repouso suficiente entre as séries e o aumento de carga decorre de forma progressiva conforme o ganho de força obtido . Podem ser utilizadas diversos tipos de resistências ( peso do corpo , elásticos , halteres , sistemas mecânicos , cicloergómetros , ergómetros manuais , outros ). Diversos estudos demonstram evidências do interesse do EF na reabilitação destes pacientes 22 , 27 , 28 , 29 , 30 , sugerindo como “ end points ” o aumento de força e de função , a normalização da marcha , a redução da fadiga , a estabilização psicológica e o aumento da mobilidade em geral . Estão descritos programas de diferente duração
( 8 – 26 semanas ), dirigidos especificamente ao tronco , aos membros ou globais . São habitualmente incluídos doentes com EDSS 1 – 5 ( baixa a média incapacidade ). A estimulação elétrica de segmentos específicos ( ex . pé pendente ) mostrou-se superior ao trabalho muscular convencional , na melhora do padrão de marcha 6 .
O trabalho de condicionamento aeróbio decorre com a prescrição de marcha , de atividades na água ou com utilização de ergómetros ( cicloergómetros para os membros inferiores ou ergómetros manuais para os membros superiores ). São implementados programas de exigência crescente , controlados pela perceção de fadiga , frequência cardíaca ou utilizando parâmetros séricos ( doseamento do lactato ). Diferentes estudos demonstram evidências do interesse da melhoria da condição aeróbia nestes pacientes 19 , 23 , 30 , 31 , 32 utilizando como “ end points ” a velocidade de marcha , a tolerância ao esforço , a perceção de fadiga , a coordenação , a função e a QV , entre outros .
O EF que combina as duas vertentes , a força e a condição aeróbia , permite potenciar a função e a qualidade de vida , em programas regulares , de baixa intensidade e baixo impacto . Os programas utilizam como “ end points ” a velocidade de marcha , a mobilidade em geral , a força e a função , entre outros 19 , 22 , 33 . Uma revisão da literatura 35 apresenta melhorias sensíveis na mobilidade , força e tolerância ao esforço ( elevação do VO 2máx
), moderada melhoria no humor ( depressão , gestão de expetativas , medos ) e reduzida melhoria no valor da EDSS , na fadiga e nos parâmetros cognitivos . É necessário aprofundar a investigação relativa ao impacto dos programas de EF nos doentes com EM 34 , sendo cada vez mais consensuais os benefícios para doentes com EDSS 1 – 6 . Os programas combinados e em grupo parecem ser os mais indicados 8 , promovendo a interação social e a motivação . Os programas são seguros , devendo o médico controlar diversos parâmetros clínicos da doença , particularmente a perceção de fadiga , os distúrbios do tónus , coordenação e o aumento da temperatura corporal .
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