Revista de Medicina Desportiva Informa Novembro 2012 | Page 10

Tema 1 Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (6), pp. 8–11 Esclerose múltipla e atividade física Prof. Dr. João Páscoa Pinheiro1, Dr. Simão Serrano2, Prof.ª Dra. Luísa Pedro3 1 Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; 1,2Serviço de Medicina Física e de Reabilitação – Centro Hospitalar Universitário de Coimbra; 3ESTESL-IPL. RESUMO ABSTRACT A prescrição de atividade física (AF) em doentes com esclerose múltipla (EM) é um tema controverso mas de grande atualidade. Diferentes estudos demonstram o interesse da prática de AF nesta população, particularmente no grupo com incapacidade baixa ou moderada. O aumento da mobilidade, a maior tolerância ao esforço e a redução da componente depressiva são os benefícios mais apresentados. The prescription of physical activity in patients with multiple sclerosis is controversial but very timely. Different studies have shown the benefits of physical activity in this population, particularly in the group with low or moderate disability. Increased mobility and exercise tolerance and the reduction of depression are the most mentioned benefits. PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS Esclerose múltipla, atividade física, resistência, força, função. Multiple sclerosis, physical activity, endurance, strength, function. Conceitos introdutórios A esclerose múltipla é uma doença crónica e degenerativa do sistema nervoso central (SNC)1,2, caraterizando-se por inflamação, gliose astrocítica e desmielinização3,4,5. É a patologia neurológica mais comum no adulto, sendo referida como a 3ª principal causa de incapacidade4,5,6,7. A deambulação está afetada em mais de 75% dos doentes6, elemento importante na perda funcional e degradação das relações laborais3. É mais frequente em adultos jovens (20–40 anos), tipicamente na 3.ª década de vida1,3,4,5,7, bem como no género feminino1,4,5,7. A incidência na criança é baixa, descrita entre 0,3 a 0,4% na 1.ª década7. Ocorre mais frequentemente em regiões temperadas, aumentando com o afastamento do equador em ambos hemisférios4,8,7. Estão identificados mais de 350 000 doentes sintomáticos na Europa2 e 2,5 milhões em todo o planeta3,4,5. São referidas prevalências de 1:100 000 na região equatorial e 100:100 00 nas latitudes temperadas8, 30–150:100 000 na Europa, 40–220:100 000 nos Estados Unidos da América e 40–80:100 000 na Austrália3,4,7,9. Manifestações clínicas As manifestações clínicas são heterogéneas 8 · Novembro 2012 www.revdesportiva.pt com elevada variabilidade individual1,7. O número de surtos, o tempo de evolução da doença, o envolvimento corticoespinhal e cerebeloso iniciais são descritos como os fatores mais ligados à incapacidade funcional8. Diversas manifestações deficitárias são descritas, nomeadamente visuais (diplopia, nistagmo), motoras (paresia, espasticidade, ataxia, dismetria, disartria, disfagia, desequilíbrio), sensoriais (parestesias, disestesias, dor), disfunção vesicoesfincteriana, alterações cognitivas e emocionais, intolerância ao calor e fadiga5,7. A fadiga é referida por 70% dos doentes 1 e para 40% é o problema principal, justificando incapacidade em atividades de vida diária (AVDs)8,10,11. As causas apontadas são múltiplas, nomeadamente desregulação do sistema imune, disfunção endócrina e neurotransmissora, descondicionamento aeróbio, deficites de mobilidade (parésia, espasticidade, tremor, ataxia), dor, distúrbio do sono, depressão e iatrogenia farmacológica10,11. As alterações da mobilidade determinam marcadas alterações nas AVDs e vida social1, afetando em especial os membros inferiores8. O equilíbrio do tronco é decisivo na mobilidade12, particularmente na resposta aos desequilíbrios externos gerados pelo movimento dos membros (elevada atividade dos músculos abdominais / transverso do abdómen e espinhais). Mais de 75% dos doentes têm deficite de equilíbrio, promovendo alargamento da base de marcha10,13. Os deficites de mobilidade e coordenação (parésia, espasticidade, ataxia, dismetria) e a fadiga determinam aumento do risco de queda (risco de fratura), justificando também a prescrição de produtos de apoio/auxiliares de marcha10,13. A espasticidade afeta 30% dos doentes, com forte redução de mobil