Revista de Medicina Desportiva Informa Março 2020 | Page 31
ser um desafio para alguns atletas
vegetarianos, devido à reduzida
densidade energética e ao elevado
teor de fibra que caracterizam
os alimentos integrantes de uma
dieta de base vegetal. 8 Esses atletas
deverão ser encorajados a realizar
várias refeições/snacks ao longo do
dia (~5-8/dia), a selecionar alimentos
com elevada densidade energética
(ex. frutos oleaginosos) e com teor
reduzido de fibra (ex. cereais mais
refinados, sumos de fruta, etc.), e
a organizar devidamente o seu dia
alimentar, de forma a terem sempre
alimentos facilmente disponíveis. 8,9
Proteína: quantidade e qualidade
É consensual que os atletas apresentam
necessidades proteicas (1,4
a 2,0 g/Kg/dia) superiores à população
em geral (0,8 g/Kg/dia). 10 Apesar
da evidência científica insuficiente
para sugerir diferentes recomendações
para atletas vegetarianos,
face aos atletas omnívoros, alguns
autores consideram prudente que
atletas veganos “orientem” a ingestão
proteica para o limite superior
das recomendações (~2,0 g/Kg/dia
ou até 2,7 g/Kg/dia, durante períodos
de maior restrição energética), para
compensar o menor valor biológico
das proteínas de origem vegetal. 11
A qualidade de uma proteína pode
ser definida como a sua capacidade
para estimular a síntese proteica
muscular e é determinada por dois
parâmetros: o conteúdo em aminoácidos
essenciais e a digestibilidade.
Face às proteínas de origem animal,
as proteínas de origem vegetal contêm
menor conteúdo de aminoácidos
essenciais (particularmente de leucina,
um aminoácido com um papel
amplamente reconhecido ao nível da
estimulação da síntese proteica, via
ativação do mTOR) e menor digestibilidade.
10 No entanto, sabe-se que
uma dieta vegetariana, que inclua
o consumo de grande variedade
de alimentos ricos em proteína de
origem vegetal durante o dia, é capaz
de fornecer todos os aminoácidos
essenciais para suportar o programa
de treino e promover a recuperação. 5
O potencial anabólico parece ser
superior nas proteínas de origem
animal. No entanto, os estudos existentes
são limitados, incidindo maioritariamente
na proteína de soja,
trigo e arroz e, portanto, são necessários
mais estudos que analisem as
propriedades anabólicas de outras
fontes de origem vegetal. 12 Adicionalmente,
alguns autores sugerem que,
desde que a ingestão proteica diária
seja suficiente e capaz de fornecer a
quantidade de aminoácidos essenciais
(particularmente de leucina)
necessária para estimular a síntese
proteica, menos relevante será a
diferença entre as fontes proteicas
(origem animal versus vegetal). 13
Suplementos ergogénicos
Tal como no atleta omnívoro, o
recurso a suplementos ergogénicos
deverá ser devidamente ponderado
e contextualizado. No atleta vegetariano,
a suplementação com
creatina e beta-alanina apresenta
algumas particularidades.
Creatina
A creatina é formada a partir de três
aminoácidos (metionina, glicina e
arginina) encontrados principalmente
na carne e no pescado. As dietas vegetarianas
têm sido associadas a uma
redução das reservas musculares de
creatina. 16,17 Num estudo de 8 semanas,
Burke et al. reportaram efeitos
positivos na performance e composição
corporal em atletas vegetarianos,
sugerindo que a suplementação com
Tabela 2 – Nutrientes-chave para o atleta vegetariano.
Nutriente a
Proteína
1,4 a 2,0 g/Kg/dia
Ácidos gordos ómega 3
EPA+DHA: 250-500 mg/
dia
Ferro
H: 11 mg/dia
M: 16 mg/dia
Cálcio
1000 mg/dia
Zinco
H: 9,4-16,3 mg/dia
M: 7,5-12,7 mg/dia
Iodo
150 mcg/dia
Vitamina B12
4 mcg/dia
Vitamina D
15 mcg/dia
Fontes alimentares b
Leguminosas, produtos à base de soja (ex. tofu e tempeh), seitan,
pseudocereais (quinoa, amaranto e trigo sarraceno), frutos oleaginosos,
sementes, lacticínios c e ovos c
Ácido alfa-linolénico (ALA): sementes e óleos de linhaça, chia e
cânhamo, soja e óleo de soja e nozes
EPA/DHA: algas e microalgas
Leguminosas, cereais integrais, hortícolas de cor verde escura,
sementes, frutos oleaginosos, tofu, tempeh e alimentos fortificados
(ex. cereais de pequeno-almoço)
Nota: a absorção do ferro não-heme é potenciada pela ingestão de alimentos
ricos em vitamina C (tais como pimento, tomate, citrinos, morango e kiwi)
Hortícolas de cor verde escura, lacticínios c , leguminosas, sementes,
frutos oleaginosos e alimentos fortificados (ex. tofu, bebidas vegetais,
cereais de pequeno-almoço)
Leguminosas, frutos oleaginosos, sementes, cereais integrais, hortícolas,
alimentos fortificados, alguns tipos de queijo c e ovos c
Sal iodado, algas e lacticínios c
Alimentos fortificados (extrato de levedura, bebidas vegetais,
cereais de pequeno-almoço e produtos substitutos de carne), lacticínios
c e ovos c
Nota: suplementação obrigatória no atleta vegan
Alimentos fortificados (cereais de pequeno-almoço, bebidas e
cremes vegetais, sumos de fruta) e ovos c
a
Recomendações adaptadas de várias fontes 10,14,15 ; b Fontes alimentares adaptadas de
várias fontes 2,6,8 ; c se aplicável, num padrão ovo-lacto-vegetariano.
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