Revista de Medicina Desportiva Informa Março 2019 | Page 18
Rev. Medicina Desportiva informa, 2019; 10(2):16-19. https://doi.org/10.23911/Prevencao_crossfit
Prevenção de Lesões no
Crossfit: Bases Científicas e
Aplicabilidade
Prof. Doutor Rodrigo Ruivo 1,4 , Fisiol. Miguel Anes-Soares 2,4 , Prof. Doutor Jorge Ruivo 3
1
Fisiologista do Exercício, Docente na Escola Superior de Desporto Rio Maior e no Instituto Politécnico
de Beja; 2 Fisiologista do Exercício, Estádio Universitário de Lisboa; 3 Assistente Hospitalar de Medicina
Interna; Departamento de Medicina Desportiva, Clínica das Conchas; Docente na Faculdade de Medicina
da Universidade de Lisboa e na Faculdade de Desporto da Universidade Lusófona; 4 Departamento de
Exercício Clínica das Conchas. Lisboa.
RESUMO / ABSTRACT
O crossfit é reconhecido como uma modalidade de treino com grande crescimento a nível
mundial. Consiste num treino constantemente variado, de alta intensidade, baseado
em movimentos funcionais. Não obstante o papel positivo que o crossfit desempenha na
melhoria da condição física, e sendo uma metodologia de elevada intensidade, é perti-
nente avaliar as lesões que lhe estão associadas, assim como definir estratégias para a
sua prevenção. Para se alcançar este objetivo é necessário respeitar os princípios de treino
(sobrecarga, individualidade, progressividade) a especificidade da modalidade.
Crossfit is recognized as a training modality with great growth worldwide. It consists of a con-
stantly varied, high-intensity training based on functional movements. Despite the positive role that
crossfit plays in the improvement of the physical condition, being a high intensity methodology, it
is pertinent to evaluate the injuries that are associated to it as well as to define strategies for its
prevention. In order to achieve this goal, it is necessary to respect the training principles (overload,
individuality, progressivity) the specificity of the modality.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Crossfit, lesões, prevenção, riscos, benefícios
Crossfit, injuries, prevention, risks, benefits
Caracterização
O crossfit está cada vez mais em voga
em todo o Mundo (142 países com
mais de 10000 afiliados), sendo que
Portugal não é exceção. 1 Este tipo
de treino foi originalmente ideali-
zado para polícias e forças especiais
militares onde frequentemente é
requerido aptidão cardiorrespira-
tória e potência muscular. Consiste
num treino constantemente variado,
de alta intensidade, baseado em
movimentos funcionais. Permite
otimizar a condição física em dez
domínios de aptidão: cardiorrespi-
ratória, resistência muscular, força
muscular, flexibilidade, potência,
velocidade, coordenação, agilidade,
equilíbrio e precisão. 1 Inclui exer-
cícios de halterofilismo, ginástica,
calisténicos, corrida e remo pratica-
dos em regime intervalado de alta
intensidade, e pode utilizar diferen-
tes materiais (halteres, kettlebells,
argolas, etc). Podemos apelidar os
treinos de Workout of the Day (WOD).
O objetivo principal num treino de
16 março 2019 www.revdesportiva.pt
crossfit pode ser terminar o WOD
o mais rápido possível (As Fast As
Possible – AFAP) ou realizar o máximo
número de repetições (As Many Reps
as Possible – AMRAP) num determi-
nado limite temporal. Por norma, os
WODs duram entre 10 e 30 minutos
e os exercícios, poli-articulares e
variados, são realizados em circuito. 2
Benefícios fisiológicos e
psicológicos
Com base numa revisão sistemá-
tica recente, usualmente, os WODs
podem resultar em adaptações
fisiológicas agudas variáveis: fre-
quência cardíaca entre 54 e 98% da
FC máxima, lacticidémia entre 6 e
15 mmol/L, % VO 2 max entre 57 e
66%, RPE entre 8 e 9 (de 10) e taxa
produto de duplo produto cerca de
12.000 mmHg. 1 De acordo com a
análise, alguns WODs [por exemplo,
Fran, Cindy (Figura) e “15,5”] podem
concordantemente ser identifica-
dos como nível de alta intensidade,
enquanto outros (por exemplo, cros-
sfit triplete) podem ser considerados
moderados. Desta forma, parece que
a prática regular de crossfit contribui
para a melhoria da condição car-
diorrespiratória, avaliada através do
VO 2 max. 3 Ainda assim, parece não
condicionar alterações significativas
na composição corporal, segundo
indica a meta-análise incorporando
estudos de intervenção de curta
duração (≥3 semanas) aplicando
crossfit (apenas 6% dos estudos
eram randomizados e controlados e
com baixo risco de viés), reforçando
necessidade de mais estudos de alta
qualidade sobre o crossfit. 1
Apesar dessa disparidade fisioló-
gica, existe a evidência de níveis mais
elevados de pertença numa comu-
nidade, satisfação e motivação entre
os participantes de crossfit, ainda que
a retenção/adesão dos participantes
não pareça ser diferente em relação
a outras modalidades de treino de
força/cardiorrespiratório. 4
Riscos
Não obstante o papel positivo que o
crossfit desempenha na melhoria da
condição física, por se basear tradi-
cionalmente na teoria dos 3 H’s – high
number of repetitions per exercise, high
loads and high speed executions, e por-
que a sua prática está cada vez mais
difundida, é pertinente avaliar o perfil
do atleta de crossfit e perceber taxas
de lesão que lhe estão associadas.
Foi realizado em 2018 um estudo
com crossfitters Portugueses, cujo
objetivo foi o de caraterizar o pra-
ticante de crossfit em Portugal e a
incidência de lesão (Ruivo, in press).
Para o efeito foram recolhidas res-
postas de 89 participantes (prática
de crossfit há pelo menos 6 meses) a
um questionário online, disponível de
Janeiro a Março de 2018. Os parti-
cipantes tinham idades compreen-
didas entre 21 e 49 anos de idade
(31.8 ± 6.2). O período de ocorrência
de lesões avaliado foram os 6 meses
que antecederam a data do preen-
chimento do questionário. A taxa de
lesão na amostra de crossfitters foi de
2,76/1000 horas de treino de atletas,
correspondendo a 24,7% de atletas
lesionados num período de 6 meses.
No que diz respeito ao número de
lesões por cada 1000 horas de treino