Revista de Medicina Desportiva Informa Março 2019 | Page 12
1. Jules A. A. C. Heuberger1, Adam F. Cohen.
Review of WADA Prohibited Substances:
Limited evidence for performance‐enhan-
cing effects. Sports Medicine, nov 2018;
https://doi.org/10.1007/s40279-018-1014-1.
2. Médico Interno de Medicina Geral e Fami-
liar, ARS Algarve - ACES Central, USF Farol;
Professor Assistente Convidado Departa-
mento de Ciências Biomédicas e Medicina,
Universidade do Algarve; aluno do curso de
pós-graduação em Medicina Desportiva da
Faculdade de Medicina do Porto.
Cardiovascular risk profile in
Olympic athletes: an unexpected
and underestimated risk scenario 1
Dra. Margarida Rodrigues 2
Medicina Física e de Reabilitação.
Vila Nova de Gaia
Resumo e comentário
As doenças cardiovasculares (CV)
são atualmente as principais causas
de morbilidade e de mortalidade
a nível mundial. Por outro lado, a
prática regular de exercício físico
desempenha um importante papel
na prevenção e, por esse motivo,
assume-se empiricamente o baixo
risco CV entre atletas de competição.
No entanto, a informação escasseia
quanto à presença de fatores de
risco CV (FRCV) neste grupo. Nesse
sentido, os autores propuseram-se
avaliar a presença de FRCV numa
população de atletas Olímpicos e
determinar as características asso-
ciadas a um melhor perfil CV.
Foram incluídos 1058 atletas (656
homens e 402 mulheres) da equipa
olímpica italiana, observados entre
Janeiro de 2014 e Junho de 2016, com
idades compreendidas entre os 15
e os 45 anos (média de 24±6 anos).
Foram avaliados os valores de pressão
arterial (PA), peso e estatura para
determinação do índice de massa
corporal (IMC), a área de superfície
10 março 2019 www.revdesportiva.pt
corporal (ASC) e a percentagem de
gordura corporal. Consideraram-se
FRCV a presença de história familiar
de patologia CV, hábitos tabágicos,
obesidade (determinado pelo valor
do perímetro abdominal), diabetes e
dislipidemia. Os atletas realizaram,
ainda, eletrocardiograma (ECG) de 12
derivações, ecocardiograma bidimen-
sional e prova de esforço em cicloer-
gómetro de membros inferiores.
Os FRCV mais comumente iden-
tificados foram a dislipidemia (32%),
o aumento do perímetro abdominal
(25%) e a história familiar de doença CV
(18%). Quarenta por cento dos atletas
não apresentava qualquer FRCV, 39%
apresentavam um FRCV, 18% apresenta-
vam dois FRCV, 3.5% apresentavam três
FRCV e 0.2% apresentavam quatro FRCV.
Os atletas sem FRCV eram maioritaria-
mente atletas de endurance (praticantes
de ciclismo, remo, triatlo, p.e.), do sexo
masculino (63%), mais jovens e que
apresentaram valores mais baixos de
peso corporal, IMC e percentagem de
gordura. Os atletas com ≥3 FRCV eram
mais velhos, praticantes de modalidades
mistas (futebol, voleibol, ténis, p.e.) e de
precisão (modalidades técnicas – golfe,
tiro com arco, p.e.), com valores mais
elevados de percentagem de gordura e
volume corporal. Neste grupo, a dislipi-
demia, o aumento do perímetro abdo-
minal, a história familiar positiva, os
hábitos tabágicos e a hipertensão (HTA)
foram os fatores de risco mais comuns.
Os atletas com idades entre os 30
e 45 anos foram aqueles que apre-
sentaram os valores mais altos de
peso corporal, IMC, ASC, percenta-
gem de gordura corporal, pressão
arterial sistólica e diastólica, e valo-
res mais baixos de frequência car-
díaca (FC) em repouso. Os valores de
colesterol total, colesterol LDL, trigli-
ceridos e glicose foram tendencial-
mente mais elevados neste grupo.
Quanto à prova de esforço, foram os
atletas com idades compreendidas
entre os 21 e 29 anos aqueles com
melhor performance. Portanto, a idade
apresentou um papel de relevo no
perfil de risco CV e, mesmo durante
a juventude, este é um aspeto que
aumenta esse risco, per se.
Também o tipo de modalidade
praticada resultou em diferentes
perfis de risco, com os atletas de
endurance a apresentarem os valores
mais elevados de colesterol HDL e os
menores valores de glicemia, coleste-
rol total, colesterol LDL, trigliceridos,
perímetro abdominal e percentagem
de gordura corporal. Este grupo teve
o melhor desempenho na prova de
esforço, dados que corroboram os
efeitos benéficos do exercício aeróbio
ao nível dos fatores de risco CV.
Apesar de não confrontarem os
resultados obtidos com o perfil de
risco CV da população geral, os
autores compararam os valores
obtidos no grupo sem FRCV com os
valores de referência propostos pelas
recomendações atuais (segundo a
European Association for Cardiovascular
Prevention & Rehabilitation). Verifica-
ram-se valores de trigliceridos 15%
mais baixos (<127 vs <150 mg/dL) e
valores de colesterol HDL 122% mais
elevados nos homens (89 vs >40 mg/
dL) e 106% nas mulheres (93 vs >45
mg/dL). Os valores de colesterol LDL
e de perímetro abdominal não foram
significativamente diferentes dos
recomendados.
Os autores concluem que a dislipi-
demia (32%) e o aumento do perí-
metro abdominal (25%) são comuns
entre atletas de elite, sendo que uma
grande proporção (40%) não apresenta
qualquer FRCV, especialmente os atle-
tas de endurance. Apenas uma minoria
(3%) apresenta risco CV elevado, em
grande parte reflexo do estilo de vida
e da presença de FRCV modificáveis.
Este trabalho alerta-nos para a
necessidade de não descurar a ava-
liação de FRCV entre atletas jovens,
os quais não estão imunes a um
perfil de risco desfavorável, espe-
cialmente se praticantes de deter-
minadas modalidades desportivas.
A prática regular de exercício, com
particular interesse o treino aeróbio,
deve ser aliada a um estilo de vida
saudável, com a adoção de uma
dieta adequada e a evicção tabágica.
1. D’Ascenzi F, et al. Cardiovascular risk profile
in Olympic athletes: an unexpected and
underestimated risk scenario. Br J Sports
Med 2019;53:37–42. doi:10.1136/bjs-
ports-2018-099530.
2. Aluna do Curso de Pós-graduação em
Medicina Desportiva da Faculdade de
Medicina do Porto. Médica Interna de
Formação Específica em Medicina Física e
de Reabilitação.