Revista de Medicina Desportiva Informa Março 2020 | Page 12
Tema 1
Rev. Medicina Desportiva informa, 2020; 11(2):10-13. https://doi.org/10.23911/insonia_2020_03
Insónia no Atleta
Dra. Margarida Aroso 1 , Dr. José Carlos Carneiro 2,3 , Dr. Manuel Vaz 2,4
1
Interna Formação Específica em Medicina Geral e Familiar, USF Pedras Rubras, ACeS Maia-Valongo;
2
Assistente Hospitalar em Pneumologia, Centro Hospitalar do Médio Ave; 3 Pós-graduado em Medicina
Desportiva; 4 Médico no Centro de Medicina Desportiva de Guimarães.
RESUMO / ABSTRACT
O sono é definido como um estado reversível que envolve uma separação percetual do
ambiente associado a uma incapacidade relativa de resposta a estímulos. O sono surge
como uma área da medicina ainda pouco estudada e por isso com muito potencial de
intervenção. Sabe-se, atualmente, que o sono não adequado (em qualidade e quantidade)
afeta as funções neurocognitiva, imunológica e até a esperança média de vida. Os défices
de sono ou a sua fragmentação têm implicações em fundamentos básicos de sucesso no
atleta: estado cognitivo, humor, tempo de reação e destreza musculoesquelética. Uma vez
que as doenças do sono, ou somente os sintomas, são muitas vezes identificados e ignorados,
deveria ser reforçada a educação dos atletas e profissionais de saúde com vista a uma
intervenção mais segura e dirigida à saúde no desporto.
Sleep is defined as a reversible state that involves a perceptual separation from the environment
associated with a relative incapacity of response to stimuli. Sleep is a field of medicine still little
understood and, as such, with potential of intervention. Nowadays, it is known that inadequate
sleep (quantity and quality) affects everything, from neurocognitive and immune function to life
expectancy. Sleep deficits or their fragmentation have implications on the basic fundamentals of
success in an athlete: cognitive state, mood, reaction time and musculoskeletal skills. Since sleep
disorders, or just symptoms, are often identified and ignored, the education of athletes and health
professionals to a safer and health-oriented intervention in sport should be enhanced.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Sono, desporto, performance
Sleep, sports, performance
Introdução
A capacidade de o atleta atingir o
seu potencial máximo e alcançar
um nível alto de sucesso é determinada
por vários fatores. Além das
influências conhecidas, como o condicionamento
físico 1 e a nutrição 2 , o
sono desempenha um papel igualmente
importante e é amplamente
considerado essencial para o ótimo
desempenho desportivo e êxito na
recuperação. 3
Figura 1 – Circunstâncias que podem comprometer o sono.
Adaptado de Fullagar HHK et al.
Comparando com não-atletas,
os atletas tendem a dormir menos
(6,5 – 6,7 horas por noite) e a qualidade
do sono é má. 4 Um bom
desempenho requer a excelência
de aspetos físicos e cognitivos, pelo
que é relevante conhecer como a
insónia pode afetar ambos. 5 Consequentemente,
há uma preocupação
emergente entre atletas e equipa
técnica sobre a importância do
sono e a necessidade de incorporar
estratégias para melhorar o sono na
preparação desportiva. 6
Efeitos da
privação de
sono
Estudos que
avaliaram
os efeitos da
privação parcial
do sono na performance
física
mostraram
que episódios
únicos de exercícios
aeróbios
e medidas máximas de força são
minimamente afetados. Em comparação,
a execução de habilidades
específicas, de exercícios sustentados
submáximos, movimento motor fino
e força muscular e capacidade anaeróbia
parecem ser mais afetrados. 3
As consequências cognitivas da
privação de sono incluem défices
na maioria das tarefas de funcionalidade,
como o tempo de reação,
memória (por exemplo, consolidação
de tarefas motoras), tomada de
decisão, e também maior variação
no humor. 3 Paralelamente, aos efeitos
da redução do tempo de sono na
resposta do organismo ao exercício,
vários estudos mostraram também
efeito sobre os mecanismos fisiológicos
envolvidos na recuperação
pós-exercício. Consequentemente,
o sono foi sugerido como a melhor
estratégia de recuperação disponível
para um atleta. 7
A privação do sono nos atletas
reduz o mecanismo de síntese de
proteína muscular e estimula processos
que resultam na degradação
muscular. Além do mais, mesmo
com a ingestão de carboidratos
normalizada, as reservas de glicogénio
muscular são reduzidas durante
a privação de sono. Este fenómeno
resulta do consumo de energia
durante a vigília forçada dos atletas.
8 Enquanto sete a nove horas de
sono é o recomendado para indivíduos
adultos saudáveis 9 , sugere-se
que os atletas necessitam de nove a
dez horas de sono para atingir o seu
potencial máximo. 10
Causas de distúrbio do sono em
atletas
A evidência demonstra que os
distúrbios do sono são comuns em
atletas. Durante os períodos de
treino, um sono perturbado pode
ocorrer devido a má higiene do
sono (ex. jogos e sessões de treino a
horas tardias e ingestão de café para
recuperação pós-exercício) 12 , queixas
crónicas de sono (ex. insónia) ou
como resposta a cargas excessiva de
treino, ou seja, sobrecarga funcional.
12 Em contraste, os distúrbios
de sono temporários podem surgir
previamente a competições devido
a alterações na rotina do sono (ex.
viagens, jet-lag, cama de hotel, ruído)
10 março 2020 www.revdesportiva.pt