Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2019 | Page 25
Morte Súbita em atletas com
MNCVE
A morte súbita em atletas é uma
temática mediática, pois apesar de
ser muito rara é trágica. Hoje em dia
a morte súbita é a primeira apresen-
tação de cardiopatias previamente
não diagnosticadas em cerca de
30-50% dos casos. 10 As principais
causas de morte em jovens são
não-cardíacas. As causas cardíacas
englobam <5% das mortes e têm
uma taxa entre 1-2 a cada 100 000
atletas por ano. 11 O mecanismo mais
comum destas é a fibrilação ven-
tricular despoletada pelo exercício
num coração com uma cardiopatia
de base. 10
As miocardiopatias mais frequen-
temente associadas a morte súbita
são a MH e a miocardioaptia arrit-
mogénica do ventriculo direito. No
estudo de Maron et al, 5% das cau-
sas de morte súbita foram atribuídas
a “outras doenças cardiovasculares”
das quais a MNCVE faz parte. Até
agora ainda não se sabe ao certo
qual o papel da MNCVE como
causa de morte súbita em atletas,
no entanto, sabe-se que esta mio-
cardiopatia nunca foi classificada
como causa major de morte súbita
nesta população específica, nem
foi atribuída como causa de morte
única ou primária em nenhum
estudo anátomo-patológico. 3 Gati et
al, no estudo já mencionado, onde
acompanhou 93 atletas com MNCVE
assintomáticos num follow-up de
48.6±14.6 meses, observou que todos
se mantiveram assintomáticos e
sem nenhum evento cardiovascular. 1
As novas recomendações da
European Society of Cardiology para a
abordagem de atletas com doenças
cardiovasculares passaram a
mencionar a MNCVE. Nestas reco-
mendações o próprio diagnóstico de
MNCVE não deve ser estabelecido a
atletas apenas com hipertrabecula-
ções na ausência de sintomas,
história familiar, anormalidades no
ECG ou disfunção do ventrículo
esquerdo e não deve haver qualquer
restrição da prática desportiva a
estes atletas. Por outro lado, em
atletas com o diagnóstico de
MNCVE, mas com função do ventrí-
culo esquerdo quase-preservada,
assintomáticos, ausência de arrit-
mias ventriculares frequentes ou
complexas e ausência de taquicardia
ventricular não sustentada no ECG
de repouso e prova de esforço e sem
história de síncope podem participar
em desportos competitivos. Por
último, aos atletas que não cum-
pram os critérios supramencionados
deve ser recomendada limitação no
seu exercício físico a desportos de
lazer e ficar sob vigilância clínica
regular. 2
É importante referir que o risco
de mortalidade é mais elevado
naqueles atletas que têm sintomas
na altura do diagnóstico, enquanto
que o risco de morbi-mortalidade
é reduzido se estes se mantiverem
assintomáticos. 9
para além da hipertrabeculação,
como a pesquisa de história pessoal
e familiar, teste de esforço, holter
24h, avaliação da função sistólica e
diastólica é seguramente benéfica.
Nos estudos realizados, a MNCVE
quando é diagnosticada em atletas
assintomáticos, e permanece nesta
forma, não altera o prognóstico. Na
presença de sintomas o prognóstico
piora e a probabilidade de necessi-
dade de transplante cardíaco ou de
morte súbita aumentam.
A análise dos estudos publicados
revela que esta miocardiopatia não
parece estar associada a morte
súbita em atletas se assintomáticos.
Entre os atletas assintomáticos
diagnosticados com esta patologia
que foram acompanhados durante
um follow-up de cerca de 5 anos
verificou-se que estes não tiveram
manifestações sintomáticas da
doença. As orientações da ESC
apontam para que pacientes com
MNCVE com sintomas, história fami-
liar, disfunção do ventrículo
esquerdo ou alterações no ECG
sejam impedidos de participar em
atividades desportivas, enquanto aos
assintomáticos é permitida a prática
das mesmas, desde que reavaliados
frequentemente.
Conclusão
Discussão
Em atletas com MCNVE considera-
mos fundamental a distinção entre
aqueles com trabeculações fisiológi-
cas por sobrecarga cardíaca e aque-
les com MNCVE. Nessa distinção,
a avaliação de outros parâmetros,
Tabela I – ETT (ecocardiograma transtorácico); MNCVE (miocardiopatia não-compac-
tada do ventrículo esquerdo)
Critérios de diagnóstico da ETT na MNCVE
Jenni et al 6 • Miocárdio com duas camadas, uma fina e compactada (C) e outra
espessada e não-compactada (NC)
• Rácio NC/C deve ser >2, medido na tele-sístole pelo eixo para-esternal.
Chin et al 7 • Rácio entre a distância entre a superfície epicárdica e o fundo do
recesso trabecular (X), e a distância entre superfície epicárdica até à
ponta de trabeculação (Y) deverá ser (X/Y) ≤ 0,5 medido na tele-diástole
pelo eixo para-esternal ou apical.
Stollberger
et al 8 • Existência de trabeculações na parede do VE, localizadas em posição
mais apical em relação aos músculos papilares e melhor visíveis em
tele-diástole. Identificação de duas camadas (não compactada e com-
pactada) na tele-sístole.
A diferenciação entre a adaptação
fisiológica dos atletas com hiper-
trabeculação daqueles com MNCVE
patológica permanece ainda um
desafio. A formulação de uma
orientação que facilite os clínicos
no diagnóstico de cada uma destas
entidades distintas, sem as confun-
direm, revela-se essencial para a
proteção dos atletas e doentes, já
que o outcome é significativamente
diferente e pode evitar erros de
diagnóstico que afete a sua vida
profissional. Quanto à morte súbita
em atletas com MNCVE, os estudos
publicados foram retrospetivos ou
realizados com populações redu-
zidas. Apesar de nos estudos já
publicados não existir relação entre
morte súbita e atletas com MNCVE
assintomáticos, estes resultados
deverão ser confirmados em estudos
de larga escala.
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