Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2013 | Page 29

Caso clínico

Rev . Medicina Desportiva informa , 2013 , 4 ( 3 ), pp . 27 – 29

Luxação da rótula num jogador de futebol de praia

Dr . André Costa 1 , Dr . Paulo Jorge Carvalho 2 , Fisiot Vítor Pimenta 3 , Dr . Basil Ribeiro 4
1
Interno Complementar , 2 Assistente de Ortopedia , 3 Fisioterapeuta , Póvoa de Varzim , 4 Medicina Desportiva , Centro Hospitalar VN Gaia – Espinho .
RESUMO / ABSTRACT
O tratamento da luxação primária traumática da rótula é ainda controverso , não existindo consenso para o tratamento ideal . Os autores apresentam um caso clínico de um jogador de futebol de praia que sofreu um primeiro episódio de luxação da rótula , tendo sido submetido a um programa de reabilitação intensivo , o que lhe permitiu a retoma da atividade desportiva sem limitações 2 meses após o evento traumático . Os autores apresentam os raros e ótimos resultados , clínicos e funcionais , da recuperação total do atleta , assim como uma revisão bibliográfica sobre abordagem conservadora , não cirúrgica , nas luxações primárias agudas da rótula .
The treatment of acute traumatic primary dislocation of the patella is still controvérsia and there is no consensus for optimal treatment . The authors present a case of a beach soccer player , who suffered a first episode of traumatic dislocation of the patella , having undergone an intense and personalized rehabilitation program and resumed his sporting activity without limitations 2 months after the traumatic event . In this context the authors present the rare and optimal clinical and functional results in the recovery of the athlete and a literature review of non-surgical , conservative approach in primary acute dislocations of the patella .
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Rótula , luxação aguda primária traumática , tratamento não cirúrgico , reabilitação . Patella , acute traumatic primary dislocation , non-surgical treatment , rehabilitation .
Introdução
A luxação traumática aguda da rótula é uma lesão complexa que afeta principalmente pacientes jovens fisicamente ativos e tipicamente ocorre na prática desportiva 1 . A fisiopatologia ainda é pouco conhecida , sendo a conduta terapêutica controversa . Representa 2 % a 3 % das lesões de joelho e é a segunda causa mais comum de hemartrose traumática do joelho 2 . A longo prazo as luxações agudas da rótula podem resultar em marcada instabilidade rotuliana ( 44 a 70 %), com taxa de recidiva de luxação de 33 %, dor crónica , incapacidade de retorno à atividade desportiva e osteoartrose patelofemoral 3 .
Os estabilizadores mediais da rótula incluem o retináculo medial superficial , o ligamento patelofemoral medial ( LPFM ), o ligamento patelotibial medial , o ligamento patelomeniscal medial e o vasto medial obliquo ( VMO ). 4 , 5 O LPFM estende-se desde a margem medial da rótula e insere-se entre o tubérculo adutor e
o epicôndilo medial . Estudos biomecânicos têm apontado o LPFM como o restritor primário à lateralização da rótula , contribuindo com 50 % a 60 % da contenção medial . 6 , 7 , 8 , 9 , 10 Por definição , nas luxações primárias agudas existe sempre lesão parcial ou total do LPFM e disrupção do retináculo medial .
A extensão e localização da lesão LPFM pode ser diagnosticada com
Fig . 1 – Representação esquemática e dissecção do LPFM , indicado na figura como MPFL . precisão recorrendo a ressonância magnética nuclear ( RMN ) 11 .
Existe uma quantidade variável de alterações anatómicas em pacientes com luxação primária : displasia troclear , patela alta , desalinhamento do aparelho extensor ( ângulo Q aumentado ), anteversão femoral aumentada com torsão tibial externa compensatória , joelho valgum , amiotrofia vasto medial , laxidez ligamentar , pronação articulação subastragalina e pé plano . 12 Contudo , a luxação também pode ocorrer em doentes com articulação patelofemoral normal se forem exercidas intensas forças externas : contração do músculo quadrícipital durante a sustentação de peso , estando o joelho fletido em valgo e com rotação externa da tíbia . As luxações rotulianas primárias resultam muitas vezes em fraturas osteocondrais , que poderão necessitar de fixação e estabilização cirúrgica . 13 A rotura no LPFM associada ao desalinhamento , à displasia e à lesão osteocondral pode ser um tratamento de difícil decisão .
A maioria dos episódios primários pode ser abordada de forma conservadora 14 , embora ocasionalmente se justifique a cirurgia , sendo necessário avaliação clínica e imagiológica criteriosa . A abordagem conservadora ideal ainda não está estabelecida , devendo as atitudes serem personalizadas caso a caso . 14
Neste caso foi aplicado um protocolo de reabilitação específico e faseado . Na fase aguda ( Fase I ) não se procedeu à tradicional imobilização gessada , tendo-se optado pelo tratamento conservador : descarga membro inferior , imobilização com tala de DePuy , gelo , repouso , alinhamento e drenagem postural do membro afetado . Iniciou-se a mobilização passiva , com aumento gradual da amplitude articular ( AA ) de acordo com a tolerância à dor e exercícios de alongamento e fortalecimento do músculo quadricipital , com exercícios em cadeia cinética fechada . Neste período foi também permitido realizar carga parcial com joelheira estabilizadora dinâmica .
Na fase II ( 2 – 4 semanas ), o objetivo foi readquirir a AA completa
Revista de Medicina Desportiva informa Maio 2013 · 27