Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2013 | Page 24

Conclusão Figura 9 – “Grey-zone” MAVD vs adaptação VD ao treino físico. Figura 10 – Diferentes “patamares” no diagnóstico de MAVD. frequentemente os cut-offs definidos. A valorização dos parâmetros volumétricos deve nestes casos ser enquadrada no contexto clínico global e da adaptação cardio-circulatória ao exercício (Figura 9). De salientar que a presença de alterações da cinética segmentar do VD (acinesia, discinesia ou aneurisma), que é obrigatória como critério de positividade para MAVD, estão tipicamente ausentes no “VD do atleta”. Por outro lado, o aumento das dimensões do VD como adaptação ao treino físico é proporcional e “simétrico” ao VE e restantes cavidades cardíacas. Não é de esperar no “coração do atleta” um VD grande, ao lado de um VE normal ou pequeno! Estudo genético Histologia e biópsia endomiocárdica A histologia é o único teste que isoladamente é capaz de estabelecer o diagnóstico definitivo de MAVD. Os critérios baseiam-se na substituição do miocárdio (< 60% miócitos residuais – critério major; 60 a 75% de miócitos residuais – critério minor) por tecido fibroso, com ou sem tecido adiposo, afetando predominantemente as camadas média e externa epicárdica. De salientar que a biópsia endomiocárdica, mesmo quando orientada por mapeamento eletroanatómico (MEA), tem baixa rentabilidade diagnóstica, pelo caráter focal e segmentar da doença na sua fase inicial e envolvimento predominante da camada externa e média, poupando frequentemente o endocárdio. Sendo um exame invasivo e tendo em conta a fragilidade da parede livre do VD, o risco de complicações não deve ser subestimado. 22 · Maio 2013 www.revdesportiva.pt A pesquisa de mutações nos principais genes desmosómicos [plakophilin2, desmoplakin, desmoglein2, desmocollin2 e plakoglobina (JUP)], pode dar um contributo importante para o diagnóstico nos casos “borderline” (1 critério major e 1 minor ou 3 minor), em que a identificação de uma mutação patogénica pode ser decisiva para a confirmação diagnóstica. De salientar que apenas cerca de 50% dos doentes com MAVD têm testes positivos para mutações desmosómicas e que um estudo negativo não invalida o diagnóstico. Por outro lado, o estudo genético não está indicado quando a expressão fenotípica da doença se limita a um ou dois critérios minor isolados6. Nos casos confirmados de MAVD (caso index) a identificação da ou das mutações patogénicas é importante não para “confirmar” o diagnóstico, mas para facilitar o rastreio dos familiares do 1.º grau. O papel do estudo genético é limitado quanto à informação prognóstica e orientação terapêutica. A confirmação ou exclusão do diagnóstico condiciona muitas vezes uma “escalada” de exames complementares (Figura 10), progressivamente mais complexos, nem sempre conclusivos, que não permitem “descolar” da zona de ambiguidade diagnóstica. A decisão deve ser suficientemente prudente de forma a evitar desqualificações por falsos positivos, defendendo o mais possível a segurança e a saúde do atleta. O diagnóstico inequívoco implica contra-indicação formal para a prática desportiva de competição, tendo em conta o papel agravante do treino físico (ao aumentar a pré-carga e o stress mecânico do VD), e o exercício como fator precipitante de disritmias malignas. A MAVD é uma miocardiopatia rara que afeta predominantemente indivíduos jovens, sendo considerada a 2.ª causa de MS em atletas. O diagnóstico é difícil, exigindo a combinação de múltiplos exames, sendo que por vezes a MS é a primeira manifestação da doença. O ECG é indiscutivelmente o método de rastreio mais importante, embora subsistam dúvidas sobre a sua eficácia. O conhecimento aprofundado das variantes da normalidade, relacionadas com a idade, etnia, género e modalidade desportiva, é fundamental para reduzir ao mínimo os falsos positivos. Continua a ser investigado o papel do exercício na aceleração da expressão fenótipica da doença e a possibilidade de formas de MAVD “secundárias” ao treino físico. O diagnóstico confirmado constitui uma contraindicação formal para a prática desportiva de competição. Referências bibliográficas: 1. Sen-Chowdhry S, Morgan RD, Chambers JC, McKenna WJ. Arrhythmogenic cardiomyopathy: etiology, diagnosis, and treatment. Annu Rev Med. 2010;61:233-53. 2. Marcus F, Zareba W, Calkins H,et al. Arrhythmogenic Right Ventricular Cardiomyopathy/Dysplasia, Clinical Presentation and Diagnostic Evaluation: Results from the North American Multidisciplinary Study Heart Rhythm. 2009; 6(7): 984–992. 3. Migliore F, Zorzi A, Michieli P, et al Prevalence of Cardiomyopathy in Italian Asymptomatic Children With Electrocardiographic T-Wave Inversion at Preparticipation Screening. Circulation. 2012;125:529-538. 4. La Gerche A, Robberecht C, Kuiperi C, et al. Lower than expected desmosomal gene mutation prevalence in endurance athletes with complex ventricular arrhythmias of right ventricular origin. Heart 2010;96:1268–74. 5. Marcus F, McKenna W, Sherrill D, et al. Diagnosis of Arrhythmogenic Right Ventricular Cardiomyopathy/Dysplasia : Proposed Modification of the Task Force Criteria. Eur Heart J 2010;31(7):806-814. 6. Ackerman M, Priori S, Willems S, et al. HRS/ EHRA Expert Consensus Statement on the State of Genetic Testing for the Channelopathies and Cardiomyopathies. Europace 2011; 13: 1077–1109. 7. Drezner J, Ashley E, Baggish A, et al. Abnormal electrocardiographic findings in athletes: recognising changes suggestive of cardiomyopathy. Br J Sports Med 2013;47:137–152.