Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2012 | Page 6

Forum Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (3), pp. 4–6 A natação como modelo de exercício físico: mito ou eficácia? RESUMO ABSTRACT A natação é frequentemente indicada para a prática de exercício físico com o objetivo de promover a aptidão física e a saúde. Considera-se como uma panaceia para todo o tipo de patologia e, ao mesmo tempo, como adequada para melhorar o estado físico do sujeito. A sua prática tem certamente utilidade, estará indicada em algumas patologias, mas os seus benefícios são limitados, pelo que não se poderá esperar qualquer evolução físico-sanitária na maioria dos casos. Contudo, continua a ser amplamente aconselhada. Com este texto pretendeu-se saber se a natação é prescrita apenas por tradição e sem conhecimento aprofundado da sua utilidade ou por convicção médico-científica, com claros benefícios para o utente. Swimming is quite often prescribed for exercise training in order to promote fitness and health. It’s considered as a panacea for all kind of pathology and, at the same time, useful to improve the physical status of the individual. Its practice has certainly some utility, it’ll be indicated for certain diseases, but its benefits are limited, and one shall not expect any improvement on fitness and health in the majority of the cases. However, it is highly recommended. It was the propose of this text to find out whether swimming is prescribed just because of tradition and without a deep knowledge of its utility or it is prescribed with medical-scientific conviction, with clear benefits for the person. PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS Natação, prescrição de exercício físico Swimming, prescription of physical exercise Prof. Dr. J. Gomes Pereira [GP], Desporsano – Clínica do Desporto, Lisboa Prof. Dr. José Soares [JS], Faculdade de Desporto do Porto Dr. Jorge Ruivo [JR], Clínica das Conchas, Lisboa Introdução A natação tem sido aconselhada como um modo adequado para a prática de exercício físico, com o objetivo de melhorar a aptidão física e o estado de saúde. Sendo um exercício praticado em meio aquático desde logo se questiona a sua utilidade, dado que não é funcional. A ausência de qualquer semelhança biomecânica com a marcha, fundamental para a independência individual, a utilização predominante dos músculos da parte superior do tronco e a falta de impacto com o solo fazem questionar a sua utilidade para o ser pedestre. Contudo, terá certamente alguma utilidade em algumas situações clínicas particulares, para além do eventual 4 · Maio 2012 www.revdesportiva.pt prazer que poderá proporcionar, pelo que não será de a excluir totalmente. Mas, agora, questiona-se se deverá praticada em exclusivo, ou obrigue a outra atividade física complementar. No sentido de perceber as suas vantagens e desvantagens, descobrir a sua eventual utilidade para a saúde, de encontrar as eventuais indicações e contra-indicações e, no final, descobrir se a natação é um mito ou tem mesmo eficácia, foram enviadas perguntas a três especialistas da prescrição do exercício físico, cujas respostas, de modo independente, ficam aqui expressas. Dr. Basil Ribeiro, editor A natação é de facto o exercício mais adequado para primeira prescrição à população em geral, no sentido de melhorar a aptidão física? GP – Em primeiro lugar é fundamental diferenciar claramente o que se entende por natação. Como médico especialista em Medicina do Exercício e ex-nadador, considero como prioritária esta diferenciação. Natação nada tem a ver com atividade física realizada em meio aquático. Pressupondo que a questão ora colocada se refere a uma população saudável, só quem domina a técnica de nado se pode submeter a um estímulo com intensidade e duração compatíveis com um resultado que se repercuta na melhoria da aptidão física. Neste contexto, só que nada bem ou os nadadores o conseguem. Logo, a natação não é o exercício mais adequado como primeira prescrição à população em geral, se levarmos em linha de conta o objetivo traçado na questão. Se estivermos a falar em atividade física realizada em meio aquático o entendimento pode ser outro e deverá seguir todas as regras de prescrição da atividade física, em todos os seus contornos, especificidades e recomendações. JS – A natação, como qualquer tipo de exercício físico, tem indicações, contra-indicações, efeitos secundários, semi-vida, etc. Ou seja, é um tipo de atividade que pode e deve ser recomendada e prescrita em algumas situações muito específicas, não tem qualquer efeito noutras e pode ter efeitos secundários indesejáveis. A natação, como a corrida, como o futebol, ou como a ginástica, é um tipo de exercício que deve ser prescrito em função das caraterísticas da pessoa e dos seus objetivos. Isto é, em termos gerais diria que a natação não é um tipo de exercício que deva ser aconselhado de forma indiscriminada a toda a população. JR – A natação é uma modalidade desportiva atualmente com uma participação em massa, uma vez que a sua promoção é pedra de toque das principais Sociedades Médico-Desportivas mundiais. A falsa segurança que advém destas recomendações, baseadas em escassa informação científica, leva à prescrição indiscriminada da natação por parte da maioria dos clínicos. O aconselhamento banal desta modalidade como primeira abordagem para efeitos de melhoria da aptidão física deve ser desencorajado, porque é fundamentado em extrapolações indevidas de outras modalidades de exercício, lacunas formativas e inseguranças. De facto,