Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2019 | Page 4

Rev. Medicina Desportiva informa, 2019; 10(4):2. https://doi.org/10.23911/Entrevista_2019_7 Dr. Gonçalo Borges Médico fisiatra, Diretor de Serviço de MFR no Hospital da Prelada, Porto É certamente um dos médicos que há mais tempo se interessa pela Medicina Desportiva (MDesp). Como começou? O desporto fez sempre parte da minha vida. Comecei pela ginástica aplicada exercícios de solo onde estive até aos 15 anos. Depois descobri o râguebi e desde então a prática desta modalidade foi determinante para a minha formação e atividade. Iniciei a especialidade de fisiatria e fui convidado pelo Dr. Luís André Rodrigues para integrar a equipe médica da natação do FCP em 1988. Aí surgiu a paixão pela MDesp e pela patologia do ombro, área onde desenvolvi busca e inves- tigação, porque em 1988 apenas se discutia joelho e desporto. Em início de 1990, o Dr. José Mário Beca convidou-me para integrar e dirigir área da fisiatria em MDesp na Porto Clínica, tendo nessa altura absor- vido as modalidades amadoras do FCP e os tratamentos de atletas com lesão ao abrigo das seguradoras do FCP. Na mesma altura já era médico do CDUP (râguebi), sendo também médico da respetiva Federação. A natação e o râguebi são as suas modalidades preferidas enquanto médico? Sim, as modalidades natação e râguebi são a minha paixão enquanto médico e investigador no desporto. É necessário conhecer bem a modalidade e o gesto técnico para que se possa entender as razões da lesão, como a tratar e prevenir, função importante do médico de equipa. Conversei e aprendi muito com o Professor Lima e depois como Professor João Paulo Vilas Boas. 2 julho 2019 www.revdesportiva.pt Joguei râguebi dos 15 aos 32 e dos 35 até hoje nos veteranos. Participei em campeonatos do Mundo de vetera- nos: Africa do Sul, Nova Zelândia, Argentina, Chile e outros países da Europa. Para além de jogador, era o médico da equipa. ... e o ombro é a articulação preferida? Nessa altura o ombro não desper- tava interesse na área médica pelo que a pesquisa era difícil, por isso fui para os EUA para a Clínica do Dr. Richard Hawquins, onde fiz uma formação muito orientada para ombro (avaliação, diagnóstico e reabilitação). Tem muita experiência nas terapêuticas ecoguiadas. É uma prática que qualquer médico do desporto deve dominar? A evolução para a ecografia de partes moles foi natural. Ainda no Hospital de Santo António via eco- grafias com o Dr. José Carlos Vas- concelos para perceber a imagem e a avaliação. Mais tarde fui a Londres a um curso de formação em ecogra- fia para membro superior. O meu amigo Dr. Ricardo Campos Costa ofereceu-me um ecógrafo que já não usava e mais tarde passei a utilizar o ecógrafo do Hospital da Prelada. Agora tenho um excelente ecógrafo oferecido pela Fundação Belmiro de Azevedo. Tenho uma consulta no Hospital da Prelada onde se pratica ecografia de partes moles e trata- mentos invasivos ecoguiados com grande sucesso, e na qual se faz a formação de médicos. É importante dominar estas técnicas de diagnos- tico e de observação, mas também de invasão articular ou de partes. Para além disso, um medico de des- porto capaz de avaliar ecografica- mente a lesão muscular, perceber o tipo, se tem hemorragia e se a aspi- rar com controlo ecográfico é, com toda a certeza, um médico avançado e numa posição muito mais técnica e evoluída do que aquele que não domina esta técnica. No desporto tem-se a perceção que os tratamentos “com as mãos” são preferidos aos “com aparelhos”: Concorda? Reabilitar e tratar pressupõe reedu- car. Os aparelhos são apenas comple- mentos necessários a esta mesma reeducação funcional. Alguns aparelhos não têm qualquer utili- dade, pelo que o seu uso deve ser abandonado. Tratar um atleta passa por perceber a lesão e a disfunção e orientar no sentido da reabilitação. Perante a lesão é necessário controlar os fatores necessários para a reabili- tação, nomeadamente a dor e a limitação funcional, e saber se a dor pode ser tratada com medicamentos e eletroterapia. A limitação funcional precisa de mão experiente, conheci- mento, paciência, intencionalidade, incentivo e técnica, utilizando sempre as técnicas de reabilitação próprias e necessárias a recuperação. É impor- tante a mão do fisioterapeuta e da orientação técnica do tratamento. É uma pessoa sabedora e com excelente espírito crítico: o que aconselha a um jovem médico que se interessa pela Medicina Desportiva? A medicina é uma paixão para além da profissão. A MDesp, sendo uma área da medicina, é igualmente uma paixão. É necessário estudar, nunca parar o estudo e a atualiza- ção. Conhecer o desporto e a sua tecnicidade é necessário. O médico de MDesp deve dominar o gesto técnico e perceber o mecanismo da lesão. Mas MDesp não é só trauma- tologia. É uma especialidade extraor- dinariamente abrangente. A especialidade está muito bem estruturada em Portugal e a apren- dizagem é excelente pela orientação da especialidade. Tudo o resto vem da aprendizagem e da experiência adquirida, em especial com os mais experientes, dando-lhes ouvidos e atenção. Ninguém nasce ensinado e nem tudo vem nos livros. Nunca parem, o caminho é sempre para a frente.