Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2019 | Page 12

avaliação estática e dinâmica, con- firmando o pé cavo bilateral e ligeiro valgo do calcaneo (ver na fígura 4 a imagem obtida na plataforma de forças). Após discussão do caso, deci- diu-se pela confeção de palmilhas personalizadas para o jogador. Estas foram realizadas com o objetivo de suportar o arco interno, criando não só maior estabilidade no pé, mas também evitando a flexão plantar exagerada do 1º metatarso. Foi ainda adicionado um elemento amortece- dor por baixo da região proximal do 1º metatarso de forma a amortecer a carga exercida nessa região. A adap- tação das palmilhas iniciou-se nas sapatilhas de treino e no calçado do dia a dia, com excelente adaptação. Uma semana depois confecionou- -se outro par de palmilhas com o mesmo objetivo, mas adaptadas às botas de futebol. O jogador iniciou o treino com a equipa, sem limitações, ao fim de 36 dias, tendo sido convocado para jogar após 41 dias do início da lesão. Até ao presente não voltou a referir sintomatologia nesta região ou ao nível dos tendões peroniais. Discussão O pé é dividido em três regiões: antepé, mediopé e retropé (Figura 5). Em termos ósseos o antepé é consti- tuído pelos metatársicos e falanges, o mediopé pelos ossos cuneiformes, cuboide e navicular, e o retropé pelo astrágalo e calcâneo. 7 O músculo longo peronial (LP) ori- gina-se na cabeça e nos dois terços proximais da face lateral do perónio, na porção da fáscia profunda, nos Figura 4 – Avaliação do jogador na plata- forma de forças 10 julho 2019 www.revdesportiva.pt septos intermusculares anterior e posterior e, ocasionalmente, atra- vés de algumas fibras do côndilo lateral da tíbia. 7 O ventre muscular termina num longo tendão que se dirige distalmente atrás do maléolo lateral, num sulco que divide com o tendão do curto peroneal. 7 O tendão do LP realiza 3 curvas até se inserir em duas tiras: uma na face lateral da base do 1º metatarso e outra na face lateral do cuneiforme medial. Ocasionalmente uma terceira tira insere-se na base do 2º metatarso. 7 É vascularizado pela artéria tibial anterior e pela artéria peroneal 8 , no entanto Peterson et al propõem que a distribuição vascular dos tendões peroniais não é homogénea e que o LP apresenta duas zonas avascu- lares: uma junto do maléolo lateral e outra junto do cuboide. Estas são zonas comuns de lesão do LP. 9 Em cerca de 5-26% da população está presente os peroneum, um pequeno osso sesamoide localizado dentro do tendão do LP, que articula com a vertente plantar do sulco do cuboide, e que pode ser causa de lesão do LP nesta região. 10 O LP atua na flexão plantar do primeiro raio e eversão do pé. O ten- dão atua ainda como flexor plantar secundário do tornozelo e como estabilizador da coluna medial do pé em posição ortostática. 12 Ambos os músculos peroniais são estabilizado- res ativos quando ocorre a inversão- -supinação, sendo que o LP também funciona como estabilizador passivo deste movimento. 11 As lesões dos tendões peroniais em desportistas estão cada vez mais Figura 5 – Esqueleto do pé reconhecidas como uma entidade patológica, e devem ser considera- das como parte do diagnóstico diferencial nos casos de dor e instabilidade lateral do tornozelo, seja aguda ou crónica. 3 As patologias destes tendões são classificadas em três categorias: tendinopatias, subluxação e roturas do tendão 13 e podem resultar de trauma direto ou devido a condições crónicas. 11 São propostos vários fatores anatómicos e biomecânicos que podem poten- ciar lesão, nomeadamente instabili- dade crónica lateral do tornozelo, pé cavo e/ou varo e ações de repetição, como ocorre na maioria dos despor- tos. 11,13 Quando ocorre a rotura de um tendão peroneal é mais comum que haja uma causa traumática, sendo o entorse do tornozelo em inversão o mais frequente 3 , mas é possível haver roturas sem nenhum episódio traumático associado. 3 As roturas espontâneas têm sido associadas à artrite reumatoide, neuropatia diabética e injeção local de corticoides. 15,16 O uso de ciproflo- xacilina e outras fluoroquinolonas tem sido associado com roturas de tendões, pelo que deve ser incluído na história clínica. 11 As roturas do tendão do LP ocor- rem mais frequentemente se combi- nadas com roturas do CP, não sendo comum encontrar descrito lesões isoladas do LP. 2-4 Estas ocorrem mais frequentemente junto do maléolo lateral, junto do tubérculo pero- neal ou na região do os peroneum 4-6 , correspondendo aos locais onde o tendão realiza as suas curvas e às duas regiões hipovasculares. 10,11,17 Praticamente não existe literatura a descrever sintomatologia isolada da região plantar medial do antepé/ mediopé por consequência de lesões do LP. Uma pesquisa na PubMed encontrou apenas um caso de rotura na inserção distal do LP, descrito por Henrie et al, em 2013. 3 O caso refere-se a uma atleta de recreação de corrida, sem passado desportivo de competição, e que tinha iniciado 4 semanas antes a preparação para a maratona. Esta atleta de 23 anos apresentou dor aguda na região plantar medial do mediopé, sem história de entorse do tornozelo ou outro evento traumático, tendo sido diagnosticada com uma rotura par- cial da inserção distal do LP, tanto