Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2019 | Page 10
Rev. Medicina Desportiva informa, 2019; 10(4):8-11. https://doi.org/10.23911/CC_dor_antepe_2019_7
Dor na Região Plantar Medial
do Antepé? Não Esquecer o
Longo Peronial
Dr. Arnaldo Abrantes 1 , Ft Filipe Valente 2 , Dr. Luís Aragão Mata 3 , Dr. Manuel Resende Sousa 4
1
Médico, Especialista de Medicina Geral e Familiar, Pós-Graduado em Medicina Desportiva, Responsável
Médico do Estoril Praia Futebol SAD, Cofundador da Athletika – Clínica Médica e Desportiva; 2
Fisioterapeuta do Estoril Praia Futebol SAD; 3 Médico, Especialista em Radiologia; CUF Hospital de Cascais
e CUF clínica de Belém; 4 Médico, Especialista em Ortopedia; Pós-Graduado em Medicina Desportiva;
Médico do Sporting Clube de Portugal, ComCorpus Clinic e Hospital Beatriz Ângelo; Coordenador da
Unidade de Pé e Tornozelo do Hospital da Luz.
RESUMO / ABSTRACT
As alterações patológicas dos tendões peroniais são causa de dor e disfunção lateral do
retropé. 1 A rotura total ou parcial do tendão longo peroneal não é habitual. 2,3 Quando
ocorre é mais frequente ser junto do maléolo lateral, no tubérculo peroneal do calcâneo
ou no sulco do osso cuboide. 4,5 Estas roturas são habitualmente agudas e ocorrem após
um trauma, mas também podem ser consequência de condições crónicas. 4-6 A rotura do
tendão na inserção distal é uma lesão muito pouco descrita na literatura. Descreve-se um
caso de rotura parcial, não-traumática, do tendão longo peronial na sua inserção distal
num jogador de futebol profissional saudável.
Pathological abnormality of the peroneal tendons is a source of lateral hindfoot pain and dysfunc-
tion. 1 A total or partial rupture of the longus peroneus is unusual. 2,3 When it occurs it is more
frequent to be near the lateral malleolus, on the peroneal tubercle of the calcaneus or on the cuboid
notch. 4,5 These ruptures are usually acute and after a trauma, but they may also be consequence
of chronic conditions. 4-6 A rupture of a tendon at its distal insertion is an injury barely described in
the literature. It is described a partial non-traumatic rupture of the distal insertion of the longus
peroneus tendon, in a healthy professional football player.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Rotura parcial da inserção longo peronial, futebol profissional, dor plantar medial do
antepé
Partial rupture on the insertion of the longus peroneus tendon, professional football, medial plantar
forefoot pain
Introdução
Homem de 30 anos, futebolista
profissional e defesa central, sem
antecedentes de doença pessoal
ou familiar relevante, sem toma de
medicação habitual ou recente, e
com antecedentes desportivos de
rotura completa do tendão de Aqui-
les da perna direita e sem história
de entorses do tornozelo ou outras
lesões. Em termos anatómicos e
físicos o jogador não apresentava
dismetria dos membros inferiores
(confirmado com radiografia extra-
longo), apresentando défice bilateral
da flexibilidade da região muscular
do tricípite sural e quantificado com
um teste Knee to Wall de 4cm bila-
teralmente, défice na abdução da
anca quantificado com amplitude
articular bilateral de cerca de 30
graus e bilateralmente com pé cavo
e calcâneo ligeiramente em valgo,
8 julho 2019 www.revdesportiva.pt
não apresentando outras alterações
do pé e dedos (Figura 1).
Figura 1 – Imagem posterior dos pés
do jogador, sendo possível observar
um pé valgo, bilateralmente. Apesar
do ângulo, é possível ver que apre-
senta um arco plantar pronunciado,
indicado pelo asterisco.
A três dias de um jogo impor-
tante, o jogador refere dor ligeira
e inespecífica da região plantar
esquerda, com predomínio no
antepé e mediopé. A dor agravava
com acelerações e saltos e atingia
um pico máximo no final do treino,
ainda que não incapacitante. O
jogador não se recorda de nenhum
momento específico para o início da
dor, negando episódios traumáticos
recentes. A dor aliviava totalmente
com o repouso, não apresentando
dor na marcha. Ao exame objetivo
não apresentava sinais inflamatórios
da região plantar, nem alterações
cutâneas e negava dor na palpação
profunda da região dolorosa ou no
squeeze test. Não apresentava dor
ou alteração funcional nos testes
de força para os diferentes grupos
musculares, nomeadamente tibial
posterior, tibial anterior, peroniais e
flexor do hállux. Iniciou fisioterapia
com trabalho manual e mobilização
articular da região do pé e tornozelo,
gelo local após os treinos, agentes
físicos e três dias de anti-inflamató-
rio não esteroide (etoricoxib 90mg), 1
vez por dia, com melhoria significa-
tiva do quadro clínico.
No dia do jogo realiza um aque-
cimento assintomático, mas aos 30
minutos da primeira parte, e após
uma aceleração de alta intensidade,
o jogador refere dor súbita e intensa
na região plantar ântero-medial
esquerda. É substituído e no final
do jogo apresenta dor intensa na
marcha, edema e dor na palpação
plantar medial, principalmente na
região da base do 1º e 2º metatar-
sos, dor na extensão do hállux e dor
ligeira na flexão plantar resistida.
Não apresentava outras alterações
no exame objetivo, nomeadamente
dor na palpação ou sinais inflama-
tórios das restantes estruturas do pé
ou queixas nos restantes movimen-
tos articulares passivos e ativos.
Foi feita descarga total do mem-
bro inferior esquerdo, repouso, gelo,
compressão e elevação, e progra-
mada uma reavaliação dentro de
dois dias. Após estes dois dias, o
jogador mantinha um quadro clínico
e exame objetivo muito semelhante
pelo que se pediu uma ressonância
magnética (RM), e de acordo com a
epidemiologia habitual e a literatura
foram colocadas várias hipóteses de
diagnóstico (Quadro I).