Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2017 | Page 23

Caso clínico

Rev . Medicina Desportiva informa , 2017 , 8 ( 4 ), pp . 21 – 23

Dor e Ressalto da Anca – Um Caso de Microinstabilidade da Anca

Dr . Carlos Costa 1 , Dr . Pedro Aroso 2 , Dra . Sofia Lopes 3 , Prof . Dr . João Pinheiro 4
1
Interno do Serviço de Reumatologia ; 2 Interno , 3 Assistente Graduado e 4 Diretor de Serviço , Serviço de Medicina Física e Reabilitação . Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra .
RESUMO / ABSTRACT
A microinstabilidade da anca é uma possível causa de dor e incapacidade em pacientes jovens . A etiologia é múltipla , contudo em muitos pacientes não se encontra uma causa subjacente . O diagnóstico da microinstabilidade da anca é extremamente desafiante e baseia-se numa boa história clínica e num exame físico minucioso e detalhado . Inicialmente o tratamento é não-cirúrgico e centra-se na reabilitação física . Apresentamos um caso de microinstabilidade da anca numa mulher jovem , sem traumatismo associado , com uma importante limitação das atividades da vida diária .
Hip microinstability is documented as a possible cause of pain and disability in young patients . Etiology of hip microinstability is multiple , however many patients lack a clear underlying cause . The diagnosis of hip microinstability is very challenge and is based on a thorough clinical history and physical examination . Treatment should be initially non-operative and focus on physical rehabilitation . We report a case about hip microinstability in a young woman without any associated trauma with important impairment on her daily activities .
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Microinstabilidade da anca , exame físico , reabilitação Hip microinstability , physical examination , rehabilitation
Introdução
A microinstabilidade da anca sintomática é reconhecida por ser uma potencial causa de dor e de incapacidade física em pacientes jovens . A estabilidade da anca depende da integridade anatómica da cabeça femoral , do acetábulo e das estruturas ligamentares e musculares associadas 1 . Esta instabilidade é definida como um movimento extrafisiológico da mesma , que causa dor , com ou sem sintomas de instabilidade , e é relativamente infrequente devido à conformidade entre a cabeça femoral e o acetábulo 1 . Na maioria dos pacientes com microinstabilidade da anca não se deteta uma etiologia subjacente . A microinstabilidade da anca pode estar ou não associada a trauma e pode ser causa ou consequência de outras patologias da anca . Pacientes com microinstabilidade podem referir sensação que a anca “ sai fora ”, com crepitação associada em posições forçadas , durante a realização das atividades da vida diária ou desportivas 2 , 3 . Os autores expõem um caso clínico de microinstabilidade da anca numa mulher jovem sem traumatismo associado .
Caso Clínico
Mulher jovem de 19 anos , estudante de enfermagem , foi referenciada à consulta de medicina física e reabilitação devido a dor na anca e virilha esquerda com um ano de evolução . Referia coxalgia de ritmo mecânico à esquerda , com irradiação para a virilha homolateral , com limitação e incapacidade progressiva para a realização das suas atividades da vida diária e desportivas .
Aos 15 anos de idade foi diagnosticada com síndrome de Osgood- -Schlater e subluxação da rótula à esquerda , com necessidade de tratamento cirúrgico . Habitualmente nadava 2 vezes por semana .
Em dezembro de 2014 , sem traumatismo prévio ou queda , apresentou dor na anca esquerda com irradiação para a virilha , zona lateral da coxa e joelho homolateral . Esta dor era desencadeada pelos movimentos de rotação externa e abdução da anca e pela atividade física . Durante este período houve um agravamento progressivo da dor , com sensação ocasional de ressalto da anca , principalmente com os movimentos de abdução . Automedicou-se com ácido acetilsalicílico , tramadol e paracetamol , sem melhoria das queixas álgicas e com agravamento progressivo da limitação para as atividades diárias e para o exercício físico . Negava artralgias de ritmo inflamatório em outras localizações , sintomas constitucionais , sintomas pélvicos ou ginecológicos .
Ao exame objetivo apresentava dor à flexão , rotação interna e abdução da anca esquerda , sem limitação ativa ou passiva da amplitude de movimento . Contudo , à máxima rotação interna havia um ressalto doloroso da anca . A palpação da virilha esquerda era dolorosa , mas não havia dor à palpação direta do grande trocânter femoral esquerdo . Os testes específicos para a instabilidade da anca foram positivos , tais como o teste de apreensão anterior ( hiperextensão e rotação externa ), teste de apreensão posterior ( em posição de supinação com a anca esquerda fletida a 90 º, realiza-se adução e rotação interna ) e teste de abdução-extensão-rotação externa .
Não apresentava alterações analíticas nos exames laboratoriais efetuados ( velocidade de sedimentação e proteína C reativa com valores normais ). A ressonância magnética nuclear ( RMN ) não revelou alterações . Realizou tomografia axial computorizada ( TAC ) sacrococcígea sem alterações , contudo na TAC pélvica apresentava uma pequena lesão cística na zona ântero-lateral da cabeça femoral ( fig . 1 e 2 ). Após realização de cintigrafia osteoarticular excluiu-se osteoma osteoide . Assumiu-se que esta pequena lesão cística era um quisto subcondral ( geode ). Revista de Medicina Desportiva informa Julho 2017 · 21