Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2012 | Page 32
Medicina prática
Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (4), pp. 30–31
Síndroma do túnel cárpico
Dr. Raul Maia e Silva
Médico Fisiatra, Porto
RESUMO ABSTRACT
No tratamento da síndroma do túnel cárpico só se justifica um tratamento cirúrgico
imediato na presença de evidência clínica de desnervação. Fora dessa situação o tratamento inicial será sempre não cirúrgico recorrendo à aplicação de talas de imobilização
do punho, ultrassons, campos eletromagnéticos e corticosteroides (orais ou em infiltração
local). A infiltração, cuja técnica é descrita neste artigo, nunca deve ser o primeiro ou o
único ato terapêutico.
The immediate surgical treatment of the tunnel carpal syndrome (CTS) it is only justified in the
presence of denervation. Conservative treatment options for CTS include splinting, ultrasound
therapy, oral and local corticosteroid injections. Anatomy, equipment, technique and aftercare for
local corticosteroid injection are described in this article.
PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
Punções e infiltrações articulares, síndroma do túnel cárpico;
Carpal tunnel syndrome, local corticosteroid injection.
A síndroma do túnel cárpico (STC)
foi recentemente revista em artigo
publicado nesta revista1 cuja leitura
aconselho. Ela resulta da compressão do nervo mediano no punho e é
a neuropatia periférica mais comum
na população geral. No desporto as
modalidades mais predispostas
ao seu aparecimento são aquelas
em se executam repetidas flexões e
extensões do punho, flexões isométricas dos dedos contra resistência
ou pegas com muita força, como
acontece no ciclismo, escalada, golfe,
hóquei, halterofilia e nas modalidades praticadas em cadeira de rodas.
O seu diagnóstico baseia-se na
história clínica (dor, adormecimentos e/ou formigueiros na mão no
território do mediano, por vezes com
agravamentos noturnos, sensação de
fraqueza muscular, dificuldade em
agarrar objetos) e no exame físico
(teste de Phalen, sinal de Tinel na
percussão do canal e alterações sensitivas no território de distribuição
do nervo mediano). O estudo da condução nervosa é reconhecido como
o exame complementar adequado
para a confirmação do seu diagnóstico2. Por outro lado, este exame ao
permitir separar as situações mais
ligeiras das mais graves tem implicações na escolha do tratamento, pois
só se justifica o tratamento cirúrgico
imediato na presença de evidência
clínica de desnervação3.
30 · Julho 2012 www.revdesportiva.pt
Os tratamentos não cirúrgicos
atualmente aceites, por terem
evidência científica forte ou moderada, são as talas de imobilização
do punho, os ultrassons, os campos
eletromagnéticos e os corticosteroides (orais ou em infiltração local)3,4.
Assim, sugere-se, em primeiro lugar,
o afastamento de qualquer fator
causal eventualmente diagnosticado (nomeadamente movimentos
repetitivos do punho e da mão) e, de
imediato, o uso de tala de repouso
do punho (mantendo as articulações
MF dos dedos em posição neutra) por
períodos de 4 a 6 semanas, usadas
ou só de noite ou o dia inteiro5,6,7.
Com os tratamentos com ultrassons
podem ser esperados resultados
satisfatórios até 6 meses de duração
nas situações mais leves da STC8.
Os corticoides orais poderão ser um
complemento do tratamento, mas
em geral os seus efeitos desaparecem
ao fim de duas a quatro semanas9.
A Associação Americana de Cirurgia Ortopédica sugere que se mude
para outro tratamento não cirúrgico
ou cirúrgico se não houver melhoria
dos sintomas entre as 2 e as 7 semanas3. É neste contexto sequencial
que entendemos ser lícito o recurso
à infiltração com corticoide e nunca
recorrendo a ela como primeiro ou
único ato terapêutico.
Tecnicamente a infiltração não
é difícil de executar, mas obriga ao
conhecimento muito preciso da anatomia da região. O retináculo flexor
(ligamento transverso do carpo), que
define o túnel, insere-se proximalmente no escafoide e no pisiforme e
distalmente no trapézio e no gancho
do hamato. O seu limite proximal
corresponde à prega distal do punho.
O nervo mediano penetra no túnel na
sua linha média por baixo do longo
palmar e medialmente em relação
ao flexor radial do carpo. As duas
vias mais comuns de acesso ao túnel
são as que rasam o tendão do longo
palmar, quer medial quer lateralmente. A via de acesso ulnar (medial)
será teoricamente mais segura que a
radial (lateral), uma vez que nesta a
agulha passa mais próximo do habitual trajeto do mediano. Com a palma
da mão para cima, o punho repousa
numa mesa em posição neutra ou em
ligeira extensão. Respeitadas as regras
de assépsia, introduz-se a agulha utilizando uma das vias de acesso atrás
referidas, entre um a três centímetros
proximalmente em relação à prega
mais distal do punho10. A agulha é
então dirigida obliquamente (30º a
45º) para baixo e para diante até a
sua extremidade se encontrar em
pleno túnel. Utilizam-se seringas de
1 ou 1,5 ml com agulhas 23G ou 25G.
Em Portugal a droga mais utilizada é
o acetato de metilprednisolona com
lidocaína. Após aspiração prévia para
evitar introdução do produto num
vaso, injeta-se 1ml (40mg) de forma
lenta. Não se deve sentir qualquer
resistência no momento da injeção
e esta deve ser praticamente indolor.
Qualquer resistência pode significar
contacto com tendões e a dor ou choque identifica contacto com o nervo,
pelo que a agulha deve ser imediatamente retirada e reposicionada.
A sensação posterior de adormecimento significará que a localização
da agulha foi a adequada. Após a
infiltração o paciente deve continuar
com a tala durante a noite e evitar
esforços por mais dez a quinze dias.