Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2020 | Page 24
Rev. Medicina Desportiva informa, 2020; 11(1):22-24. https://doi.org/10.23911/T_incont:_urina_atleta_2020_1
Incontinência Urinária
em Jovens Atletas – Um
Problema Silencioso
Dra. Filipa Alexandra Pereira 1,4 , Dra. Ana Martins 2 , Dra. Mariana Saavedra 1,4 , Dr. Rui Vaz 3,4 , Dra. Maria
João Azevedo 3,4
1,4
Interno de Formação Específica de Medicina Física e de Reabilitação (MFR); 2 Interno de Formação
Específica de MFR. Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga; 3 Assistente Hospitalar de MFR. 4 Hospital da
Senhora da Oliveira. Guimarães.
RESUMO / ABSTRACT
A incontinência urinária pode afetar jovens atletas, nomeadamente as praticantes de
desporto de alto impacto. A transmissão da pressão intra-abdominal de forma inadequada
para o pavimento pélvico, a fadiga muscular fácil, a alteração do tecido conjuntivo, as
alterações hormonais e as perturbações alimentares têm sido descritas como fatores de
risco. O tratamento preconizado inclui reeducação da musculatura pélvica/core abdominal
e controlo respiratório. Pelo impacto negativo na qualidade de vida das atletas é necessária
uma intervenção por parte dos profissionais de saúde de forma a prevenir e tratar este
problema.
High-impact sports have been associated with urinary incontinence. No effective contraction of the
pelvic floor muscles during increased abdominal pressure, easy muscle fatigue, genetically weak
connective tissue, hormonal changes, eating disorders are some risk factors described. Pelvic floor
and abdominal muscles rehabilitation and respiratory control are considered the first-line treatment.
Due to the negative impact on quality of life, a professional health care intervention is needed to
prevent and treat this problem.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Incontinência Urinária, jovens atletas, reabilitação, pavimento pélvico.
Urinary incontinence, young athletes, rehabilitation, pelvic floor muscle.
Introdução
A Incontinência Urinária (IU) na
mulher foi definida pela International
Continence Society como “qualquer
perda involuntária de urina”. 1
Pode ser classificada como:
1) de esforço – perda urinária asso-
ciada ao esforço, espirro, riso ou
tosse;
2) de urgência – perda urinária
acompanhada ou precedida de
urgência miccional;
3) m
ista – quando existe sintomato-
logia de ambos os tipos anteriores. 2
Segundo a Associação Portuguesa
de Urologia (2013), estima-se que
afeta cerca de 60 milhões de pessoas
mundialmente e 600 mil em Portu-
gal, nos diferentes grupos etários.
Trata-se de um sinal geralmente
descrito por mulheres de idade
avançada e multíparas. A sua pre-
valência entre os 15 e os 60 anos de
idade varia entre os 10-55%. 3
22 janeiro 2020 www.revdesportiva.pt
A IU pode interferir com o bem-
-estar social e mental da mulher,
tendo impacto na qualidade de vida,
podendo estar associada a situações
de baixa autoestima e depressão. 3,4
Incontinência urinária na prática
desportiva
Cada vez mais estudos demonstram
que existe elevada prevalência
desta disfunção em atletas do sexo
feminino, jovens e nulíparas, sendo
2.5 vezes mais suscetíveis de desen-
volver IU quando comparadas com
mulheres sedentárias. 5 Na mesma
faixa etária, está descrito que cerca
de 30% das mulheres que praticam
desporto tem perdas urinárias pelo
menos uma vez durante o exercício
e o subtipo mais comum é o de
esforço. 3,4,6,7
A prática desportiva intensiva,
sobretudo a de alto impacto, é
considerada um fator de risco para
o desenvolvimento de IU. De acordo
com a literatura, é condicionada
pelo aumento da pressão intra-
-abdominal que, por sua vez, exerce
elevadas pressões sobre os múscu-
los do pavimento pélvico (MPP). 6 O
mecanismo de continência é afetado
pela transmissão do choque, que
ocorre entre os pés e o chão e que
é transmitido para esta muscula-
tura. 3,4 Longos saltos podem gerar
uma força máxima de reação que
aumenta em 16 vezes o peso corpo-
ral, 9 vezes na queda após salto em
altura e 3 a 4 vezes na corrida. 4,6
A prevalência da IU em mulheres
atletas varia consoante a modalidade
praticada, desde 80% nas pratican-
tes de trampolim até aos 0% nas
praticantes de golfe. 3 Geralmente
são os desportos de alto impacto,
que incluem saltos ou corrida, que
criam aumento súbito da pres-
são intra-abdominal, os principais
responsáveis pela IU. 6 O salto está
descrito como a atividade com
maior probabilidade de causar IU. 4
De modo geral, os desportos com
maior prevalência são a ginástica
(mais concretamente o trampolim),
o basquetebol, o atletismo, o ténis e
o hóquei. 3,4,8
Preconizam-se duas hipóteses
que tentam explicar esta disfunção
do pavimento pélvico nas atletas.
A primeira defende que a prática
de exercício físico, pelo aumento
da pressão intra-abdominal, deverá
conduzir a uma pré-contração mus-
cular, fortalecendo os músculos do
pavimento pélvico. Nesta situação,
a prática desportiva acabaria por
prevenir a IU. No entanto, quando
não ocorre uma efetiva contração ou
a pré-contração desta musculatura,
em que o mecanismo de continên-
cia é insuficiente, as atletas podem
perder urina durante a prática des-
portiva. 4,9 Estão enumeradas como
possíveis causas destas perdas: fra-
queza genética do tecido conjuntivo
na região perineal (reduzido ratio
de colagénio tipo I e III), localização
inferior dos músculos do pavimento
pélvico e baixo número de fibras
musculares, especialmente de fibras
rápidas. 4,6
A segunda hipótese refere que
as forças de impacto direcionadas
ao pavimento pélvico e o aumento
regular e repetitivo da pressão intra-
-abdominal podem sobrecarregar,