Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2019 | Page 4
Rev. Medicina Desportiva informa, 2019; 10(1):2. https://doi.org/10.23911/Entrevista_Maia_Goncalves
Dr. J. P. Maia
Gonçalves
Ortopedista.
Cirurgião de coluna
Hospital da Luz,
Arrábida.
Vila Nova de Gaia.
Terminou recentemente uma
corrida ironman. O que é esta
corrida?
É uma prova de triatlo que
envolve 3,8km de natação em
águas abertas, 180km de bici-
cleta e 42km a correr. Terminei
em outubro de 2018 a prova que
se realizou em Barcelona.
Ficou satisfeito com o
resultado? Já agora, qual foi?
Muito satisfeito, mais … um sonho
realizado! Cumpri a prova em
11h35min. Tinha como objetivo
fazer menos de 12 horas, pelo que o
objetivo foi amplamente alcançado.
Mesmo com alguns contratempos nas
transições, como a avaria no fecho
do fato de natação na saída da água,
o que me custou vários minutos de
sofrimento e sem poder ter ajuda por
ser proibido, o imponderável estado
de agitação do mar, que nos atirava
para terra quando tentávamos entrar
mar dentro, e mesmo o facto de ter
chovido muito durante a parte da bici-
cleta, o que originou muitos acidentes.
Para fazer esta prova é necessário
treinar muito. Como consegue
conciliar o trabalho com os treinos,
tão diferentes entre si?
É nesta conciliação que reside o
sucesso, aliado a um forte apoio
e compreensão da família. Treino
diariamente, com exceção à 3.ª feira,
que seria o dia de descanso, mas
como opero o dia todo de pé (cirur-
gia da coluna), não é um verdadeiro
descanso, pois por vezes saio mais
cansado do que dos treinos. Destes
treinos, 2 por semana podem ser
combinados (2 ou 3 disciplinas), para
simular transições e habituar o corpo
a elas. O treino à semana é ao final
do dia/noite e ao fim de semana
é durante a manhã, o que dá em
2 janeiro 2019 www.revdesportiva.pt
média 12 horas por semana, durante
seis meses. Exige constância, disci-
plina, muita resiliência e espírito de
sacrifício, e mesmo durante as férias
efetuei treinos bi-diários.
Pertenço a um clube de triatlo com
muita tradição, a AASM, e a partilha
de experiência com os outros atletas
mais experientes, em conjunto com a
orientação do treinador Paulo Adão,
foram fulcrais, sobretudo na nata-
ção. O treino de corrida foi sempre
em conjunto com elementos do meu
clube Cães d’Avenida, cujo apoio e
companhia foram inexcedíveis, sobre-
tudo naqueles dias em que não me
apetecia fazer séries. Estar lá alguém
para me motivar e puxar por mim foi
uma mais-valia. O treino técnico foi
coordenado pela Marisa (Run4Exce-
lence), muito cientifico e estruturado.
A bicicleta foi sempre em conjunto
com os meus dois companheiros de
aventura, o Miguel Catarino e o Rui
Barbosa, sob a forte orientação do
Filipe Cardoso, ciclista profissional,
dono da Grandíssima (loja que é um
hino ao ciclismo), o qual se encantou
por ajudar amadores triatletas.
E o apoio nutricional? Como foi
aconselhado?
A nutrição é talvez um dos maiores
segredos na forma física. Para a recu-
peração entre treinos e provas-treino
é talvez a variável mais importante.
Sou orientado do ponto de vista
nutricional pelo Luís Miguel Silva,
um nutricionista-atleta de BTT, que
compreende as nossas necessidades
e, sobretudo, dificuldades em manter
tantos meses de rigor nutricional.
O cuidado no horário das refeições
e a ingestão regular de alimentos
são regras muito difíceis de cumprir,
especialmente quando a atividade
profissional é a cirurgia, sempre
cheia de imponderáveis.
… e como, quando e o que se come
durante as mais de dez horas de
competição?
Na prova o corpo precisa de ser
alimentado e hidratado com quali-
dade. Podemos ter o melhor motor e
chassis, mas se não metermos com-
bustível de qualidade a máquina
para: hidratos adequados, bebidas
isotónicas, proteínas na dose certa
e, sobretudo, no momento certo são
os ingredientes secretos. É como
preparar um menu, que levei colado
no quadro da bicicleta para melhor
orientação.
Ouve-se dizer que durante a
preparação da prova, mesmo o
baixo consumo de álcool perturba
o funcionamento muscular. É
mesmo assim? O que lhe diz a sua
experiência?
De facto, sempre gostei de social-
mente beber um bom vinho, mas
durante a preparação para as provas
dos últimos anos (25 maratonas e
12 provas de ultradistância) sempre
conciliei o baixo consumo de álcool
com o treino. Desta vez, contudo,
o objetivo era mais arrojado, tive
necessidade de ser mais rigoroso e
parei de facto de beber álcool nos
seis meses anteriores. Tal resultou
na capacidade de recuperação entre
treinos muito mais rápida e com
muito menos mialgias.
Repete a prova? Qual o próximo
desafio?
Em 2019 estou inscrito num half-
-ironman, porque fiquei de facto a
adorar o triatlo e metade da distân-
cia é já uma grande aventura com
menor desgaste físico. A variação da
prática destas modalidades permite
manter uma forma física mais apu-
rada e equilibrada, com menos dores
miofasciais, as quais tantas vezes
limitam os treinos e o rendimento.