Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2016 | Page 4

Entrevista Rev. Medicina Desportiva informa, 2016, 7 (1), pp. 2 Dr. Miguel Mendes Cardiologista. Presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia Como tem orientado a sua presidência nesta sociedade médica? A minha presidência tem-se orientado em duas vertentes: a interna e a externa. Na frente interna, tem estado centrada no atingimento dos objetivos programáticos da direção e na organização do congresso anual, um dos maiores eventos científicos do país, com cerca de 2000 participantes envolvidos em Medicina Cardiovascular. De acordo com o nosso programa de ação, a maior parte dos esforços neste 1.º semestre do mandato tem sido concentrada na revisão dos estatutos e na elaboração de uma proposta de renovação da estrutura do internato da especialidade. Na frente externa, temos desenvolvido atividades junto da sociedade civil em datas chave, como o mês de Maio e o Dia Mundial do Coração, tentando divulgar as necessárias atitudes preventivas. Temos ainda desenvolvido alguma colaboração com outras sociedades científicas e atuado junto das entidades oficiais. A Cardiologia tem sido bastante curativa, mas a perspetiva preventiva tem ganho cada vez mais atenção... Nas últimas décadas a Cardiologia têm-se afirmado através da Cardiologia de Intervenção (na doença coronária e no tratamento pouco invasivo de várias situações de doença estrutural intracardíaca ou nos grandes vasos) e da arritmologia, que tem hoje uma capacidade notável no tratamento por ablação através de catéter de muitas arritmias e de implantação de dispositivos destinados a manter o ritmo e a intervir na insuficiência cardíaca e na morte súbita. Estas intervenções, para que se obtenha todo o seu potencial, implicam a observância posterior de regimes terapêuticos a longo prazo, 2 ·Janeiro 2016 www.revdesportiva.pt compostos por terapêutica farmacológica e adoção de um estilo de vida saudável, que deverá associar á dieta adequada, á prática regular de exercício físico moderado e ao controlo do stress psicológico. Por outro lado, para além dos doentes, também a população geral, necessita adotar este estilo de vida para atrasar o aparecimento ou a minimizar a expressão das manifestações das doenças relacionadas com aterosclerose. Atualmente há 2 grandes problemas na saúde cardiovascular na população: a elevada incidência de acidente vascular cerebral nos mais velhos e a obesidade em crianças e adolescentes. Devido ao potencial impacto negativo da obesidade corre-se o risco da atual geração de jovens, pela primeira vez na história, não venha a usufruir de um aumento da esperança de vida como tem acontecido regularmente nas últimas décadas. Por este motivo, é fundamental apostar na prevenção primordial e primária, mais da responsabilidade dos Cuidados Primários de Saúde e, sobretudo, da família e da escola. Só através da educação e da promoção de mudanças culturais, realizadas de forma concertada com a Saúde, será possível obter resultados positivos neste domínio. ... e o médico da Medicina Geral e Familiar pode ter um papel importante ... O médico de MGF, conhecendo bem a família e acompanhando-a ao longo de anos, tem uma capacidade de intervenção notável. Fruto das minhas responsabilidades de diretor de serviço de Cardiologia tenho tido contactos com a estrutura da MGF e com os colegas desta especialidade da área do meu hospital e tenho verificado com agrado que estão muito atentos e empenhados nesta intervenção. A morte súbita faz parte do desporto. Que cuidados há a ter para a sua prevenção? Ver morrer um atleta, em campo ou no decorrer das do seu dia-a-dia, é sempre uma situação constrangedora e revoltante pelo inesperado da situação. Levanta múltiplas questões: a primeira questão que surge é se poderia ter sido evitada nomeadamente por uma avaliação médica. Para além desta avaliação médica, também é fundamental que o atleta não se exponha à dopagem, nem a situações potencialmente malignas, como a prática de esforços em circunstâncias extremas, por exemplo de temperatura ou de altitude, ou de exigência física brutal. Os treinadores e os dirigentes desportivos também devem ser sensibilizados para esta problemática. Alguma vez será possível eliminá-la do desporto? O estudo genético será a solução? Provavelmente não será possível reduzir a zero a morte súbita no desporto porque há sempre situações que não são detetáveis no exame médico habitual e outras que podem surgir de forma imprevista, como