Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2016 | Page 12

esforços estáticos (classe IIIA a IIIC10) e a suspensão do uso de qualquer EAA. Discussão Figura 2 – Eletrocardiograma de 12 derivações à admissão foi medicado com dose de carga de aspirina e ticagrelor e com heparina não fracionada e realizou cateterismo, que mostrou oclusão proximal da artéria coronária direita (CD) (figura 3A) e lesão suboclusiva da primeira diagonal da descendente anterior (DA). Procedeu-se a intervenção coronária percutânea (ICP) da artéria culpada, a CD, com trombectomia instrumental, pré-dilatação com balão e colocação de dois stents metálicos não impregnados, o segundo parcialmente sobreposto ao anterior (figura 3B). As análises revelaram troponina I superior a 99 ng/mL, CK-MB 263 U/L e CK 2631 U/L. Quanto ao perfil lipídico, os valores de colesterol total foram de 153 mg/dL, HDL 25 mg/dL e LDL de 106 mg/dL. A hemoglobina A1c foi de 5.5%. Posteriormente, verificou-se melhoria clínica, analítica e eletrocardiográfica. Realizou ecocardiograma transtorácico, que mostrou hipertrofia do ventrículo esquerdo (HVE) e acinésia dos segmentos basal e médio da parede inferior, com fração de ejeção (FE) de 52%. Ainda durante o internamento, repetiu-se ICP para tratamento da lesão suboclusiva da primeira diagonal, com colocação de um stent impregnado com fármaco. Foi iniciada a terapêutica médica para o EAM, incluindo AAS, ticagrelor, A B beta-bloqueante, estatina e iECA. Por apresenFigura 3 – Imagens do cateterismo antes (A) e após tar HTA, aconselhou-se (B) a colocação de stent metálico na coronária direita à não realização de proximal EAA, administrados por via intramuscular, semanalmente e de forma ininterrupta (não fazia ciclos de administração), desde há 13 anos; no último mês refere ter administrado undecilenato de boldenona 200 mg semanalmente e cipionato de testosterona 600mg quinzenalmente, período durante o qual suspendeu também a toma dos fármacos anti-hipertensores, por vontade própria. Referia praticar halterofilismo não competitivo, com treinos de duração de 1.5-2 horas, cerca de 10 vezes por semana, desde há 13 anos. Ao exame objetivo destacava-se uma aparência musculada, IMC de 30.80 kg/m2, pressão arterial de 150/85mmHg e frequência cardíaca (FC) de 72bpm, não apresentando sinais de IC ou outras alterações. Realizou eletrocardiograma (ECG) que mostrou um ritmo sinusal, com FC de 75bpm, supradesnivelamento de ST de cerca de 5mm em DII, DIII e aVF e infra-desnivelamento de 4mm em V1, V2 e aVL e ainda extrassistolia ventricular frequente (figura 2). Assumiu-se o diagnóstico de EAM com supradesnivelamento do segmento ST (EAMCSST), o doente 10 ·Janeiro 2016 www.revdesportiva.pt A associação entre o uso de EAA e o EAM tem sido descrita em casos clínicos ou pequenos estudos de atletas que admitem usar EAA, mas com diferentes doses e tempos de consumo. Tipicamente, os atletas usam um regime de “stacking” (empilhamento), isto é, administram simultaneamente vários tipos de compostos de EAA para aumentar a potencialidade de cada um deles, em ciclos de algumas semanas. Além disso, muitos deles usam combinações com outras substâncias, pelo que as consequências podem não ser devidas somente aos EAA9, o que torna mais difícil tirar conclusões. Não é obviamente ético a realização de estudos interventivos e randomizados, mas é provável que a frequência de eventos cardíacos esteja subestimada na literatura médica6. No caso apresentado, o doente admitia tomar mais de um composto simultaneamente no último mês e com consumo continuado desde há 13 anos, não realizando ciclos de administração, mas tomando doses fixas ininterruptamente, o que corresponde a doses elevadas a longo prazo; a acrescentar a isso, suspendeu a terapêutica anti-hipertensora. Quanto ao treino realizado, o halterofilismo é um exercício com componente estática elevada e dinâmica moderada – classe IIIB na classificação dos desportos proposta na 36.ª Conferência de Bethesda (2005)10. Neste caso, o doente referia não competir, mas mantinha a prática regular de treinos intensos. A associação entre o EAM e o consumo a longo prazo de EAA é proposta pelos autores, apesar da presença de HTA e idade de 56 anos. A doença coronária arterial grave e o trombo detetados durante o cateterismo podem ser explicados pelos efeitos aterogénico e trombótico dos EAA. O perfil lipídico mostra um HDL baixo, mas o valor de LDL não é excessivamente alto. Assim sendo, e apesar de alguns autores defenderem que a associação entre o uso de EAA e o aumento do risco CV se deve