Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2012 | Page 12
Tema 2
Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (1), pp. 10–12
Fatores psicológicos e lesões
desportivas: da fantasia à
realidade
Doutor Rui Gomes
Universidade Minho, Escola de Psicologia, Braga
RESUMO ABSTRACT
Este trabalho discute a importância dos fatores psicológicos na prevenção e recuperação
de lesões. Assim, são apresentadas algumas indicações acerca da associação entre stress
e lesões, analisando-se a importância da personalidade e da capacidade de confronto dos
atletas face à ocorrência de situações de stress. Finalmente, apresentam-se alguns fatores
que ajudam a explicar a pouca utilização da intervenção psicológica na prevenção e tratamento de lesões desportivas.
This paper discusses the importance of psychological factors in injury prevention and recovery. Some
indications about the association between stress and injuries are presented, being also analyzed the
importance of personality and coping strategies used by athletes when they have to face stressful
situations. Finally, it is presented some factors that explain the limited use of psychological intervention in the prevention and treatment of sports injuries.
PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
Lesões desportivas, fatores psicológicos, intervenção psicológica.
Sports injuries, psychological factors, psychological intervention.
A prática desportiva, principalmente
a de alto nível, tem vindo a colocar
uma exigência crescente sobre a
capacidade de adaptação física e
psicológica dos atletas. De facto,
assistimos em várias modalidades
a maiores exigências competitivas
(seja em termos de frequência mas
também da intensidade das mesmas), colocando ao atleta o desafio
de se apresentar na melhor forma
possível ao longo de toda a época
desportiva.
Neste sentido, a ocorrência de
lesões desportivas representam uma
alteração altamente indesejável das
rotinas de rendimento dos atletas,
colocando também uma significativa pressão sobre os profissionais
de saúde no sentido de recuperarem
rapidamente os atletas. Entramos
assim no domínio dos fatores envolvidos na recuperação das lesões, um
tema fascinante pela sua complexidade, mas sobretudo desafiante pela
significativa variabilidade individual
que é possível observar na recuperação do mesmo tipo de lesão por
atletas diferentes.
A este nível, os fatores psicológicos costumam ser enunciados
como podendo alterar o curso de
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recuperação de uma lesão, transformando um bom prognóstico
num “caso difícil de perceber” mas
também uma lesão com recuperação lenta e duvidosa num caso de
“sucesso inesperado”. No entanto,
também é interessante verificar que
os fatores psicológicos não estão
apenas envolvidos após a ocorrência
da lesão, mas também representam
fatores predisponentes para a lesão.
Assim sendo, a intervenção junto do
atleta pode estar não só centrada no
apoio à recuperação da lesão, mas
também pode ser direcionada para
a promoção de competências que o
ajudem a evitar essa mesma situação.
Importância dos fatores
psicológicos
Um dos aspetos que merece alguma
crítica a este nível, é a ainda falta
de sensibilidade ou desconhecimentos dos profissionais envolvidos no
treino e recuperação dos atletas
para o papel dos fatores psicológicos
envolvidos nas lesões desportivas.
Por exemplo, hoje em dia é vulgar
vermos incluídos preparadores
físicos nas equipas técnicas, tendo
uma responsabilidade crucial no
planeamento do treino ao longo da
época desportiva. Daí que seja relativamente fácil encontrar programas
de treino da força, da resistência, da
flexibilidade e da própria coordenação motora, que auxiliam os atletas
a recuperarem do esforço físico e a
melhorarem as suas capacidades
desportivas, tornando-se assim
menos suscetíveis à ocorrência de
lesões.
No entanto, quando observamos
a existência de profissionais com
formação de base em psicologia, a
situação está longe do ideal e não
se pode afirmar que seja devido ao
pouco impacto dos fatores psicológicos no desporto. A título de exemplo,
está comprovada a existência de
uma associação entre a exposição a
situações de stress e o risco para as
lesões desportivas (ver Brewer, 2009;
Heil, 1993). Além disso, a investigação tem vindo a realçar a importância que alguns fatores podem ter
no aumentar ou diminuir da “força”
desta relação (ver Williams & Andersen, 1998). Desde logo, as características de personalidade dos atletas.
Por exemplo, se o atleta evidenciar
um elevado traço de ansiedade
competitiva (ou seja, tender a ficar
mais ansioso perante as diferentes
exigências desportivas), apresentar
estados de humor mais negativos e
assumir-se como uma pessoa agressiva e altamente competitiva então
estará em maior risco para contrair
não só mais lesões mas também
lesões mais graves.
Um outro fator interveniente
nesta relação stress-lesão, é a capacidade do atleta lidar com os problemas. Na literatura, este conceito
aparece designado como coping (ou
confronto, no português) e refere-se às potencialidades das pessoas
para enfrentarem os desafios do