Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2012 | Page 10

Tema 1 Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (1), pp. 8–9 Atividade física e a síndrome do intestino irritável Dr. Ricardo Veloso1; Dr. José Fraga2 Interno de especialidade de Gastrenterologia; 2Director de Serviço de Gastrenterologia e Hepatologia Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia–Espinho, EPE 1 RESUMO ABSTRACT O Síndrome do Intestino Irritável (SII) é uma doença crónica frequente que afeta a qualidade de vida e acarreta grandes custos para os sistemas de saúde. Existem várias modalidades terapêuticas disponíveis para o SII, mas a maioria não proporciona alívio eficaz e duradouro dos sintomas. A atividade física é atualmente utilizada como modalidade terapêutica em múltiplas doenças, mas o seu estudo no SII era, até há pouco tempo, escasso. Com o aparecimento de alguns estudos recentes sabe-se que a atividade física regular deve fazer parte da terapêutica primária dos doentes com SII, uma vez que melhora os sintomas e a qualidade de vida. Irritable Bowel Syndrome (IBS) is a frequent chronic disease that affects quality of life and is associated with a considerable health-care burden. There are multiple therapeutic options for IBS, but most of them fail to deliver adequate and longstanding symptom relief. Physical activity has been used in treating multiple diseases, but studies on IBS were lacking. Recent studies showed us that regular physical activity should be used as a primary therapeutic intervention on IBS patients once it improves symptoms and quality-of-life. PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS Síndrome do intestino irritável, tratamento, atividade física. Irritable bowel syndrome, treatment, physical activity. Introdução A síndrome do intestino irritável (SII) é uma doença gastrointestinal funcional caraterizada por dor (ou desconforto abdominal) crónica, associada a alterações do trânsito intestinal1. É doença frequente, com uma prevalência de 11,5% na Europa2, apesar de existir alguma variabilidade entre os diferentes países europeus. É mais prevalente nas mulheres com um rácio mulher/ homem de 2.0 a 2.5:1. Tipicamente é diagnosticada entre os 30 e os 50 anos. Trata-se de uma doença com significativo impacto na qualidade de vida, comparável ao impacto provocado pela doença do refluxo gastro-esofágico e pela depressão3, com elevados gastos económicos no seu diagnóstico e tratamento4, provocando aumento do absentismo ao trabalho (8.5 – 21.6 dias em média)5. Definição e Diagnóstico O diagnóstico do SII é um diagnóstico clínico, sendo a dor abdominal 8 · Janeiro 2012 www.revdesportiva.pt o sintoma principal e o principal responsável pela diminuição na qualidade de vida, gravidade da doença e utilização dos recursos de saúde. O diagnóstico do SII é baseado na associação de dor/desconforto abdominal recorrente com alteração do trânsito intestinal, diarreia ou obstipação, tal como o definido pelos critérios Roma III para SII (Tabela 1)6. noturna, anemia, hematoquésias ou a existência de história familiar de carcinoma colo-retal, doença celíaca ou doença inflamatória intestinal, não são típicos do SII e devem alertar o clínico para a necessidade de exclusão de outras patologias. Tratamento do SII O tratamento do SII deve ser multifacetado e orientado para o doente, de forma a melhor se conseguir um adequado controlo dos sintomas, uma vez que não existe tratamento definitivo para esta doença. O tratamento desta doença deve ser programado e proposto ao doente, devendo englobar várias intervenções terapêuticas complementares. SII e atividade física Apesar de geralmente se recomendar atividade física diária como parte do tratamento do SII, até recentemente havia poucos estudos relativos a este assunto. É sabido que o exercício físico é benéfico para prevenir ou auxiliar no tratamento TABELA 1. CRITÉRIOS DE ROMA III PARA O DIAGNÓSTICO DE SII Dor ou desconforto abdominal recorrente pelo menos 3 dias por mês nos últimos 3 meses associado a dois ou mais dos seguintes 1. Melhoria com as dejeções 2.Sintomas associados com a alteração na frequência das dejeções 3. Sintomas associados com a alteração da aparência (formato) das fezes Desconforto abdominal significa uma sensação desconfortável não descrita como dor. Outros sintomas frequentes nos doentes com SII são fezes duras ou aquosas, esforço defecatório, urgência defecatória, sensação de dejeção incompleta, presença de muco nas fezes e distensão abdominal, este último presente na grande maioria dos doentes com SII (até 96%7). Por outro lado, o aparecimento dos sintomas após os 50 anos de idade, perda de peso não intencional, diarreia de várias doenças como a depressão, a fibromialgia e mesmo o cancro colo-retal8. Estudos em indivíduos saudáveis mostraram que a atividade física é capaz de melhorar a distensão abdominal e a emissão de gases9. Sabe-se também que o exercício físico regular moderado é capaz de melhorar o tempo de trânsito cólico em doentes cronicamente obstipados10. Contudo, há igualmente