Revista da OPAN /Edição 1 | Page 8

E N T R E V I S T A
A I L T O N K R E N A K
P Á G I N A 7
Como o jovem Krenak do fim da década de 1980 olharia para a atual juventude indígena ? Os povos estão bem representados ?
As novas gerações estão sabendo fazer um uso muito consequente desse espaço de tela , a exemplo dos artistas indígenas . A nossa querida Naine Terena é a curadora da exposição “ Vexóa : nós sabemos ”, lá na Pinacoteca em São Paulo . Será inaugurada brevemente uma exposição só de artistas indígenas , que tem a curadoria da Naine . É uma exposição potente . Traz um discurso que extrapola a especulação que a arte contemporânea faz . Apresenta a voz plural dos povos originários e tem uma capacidade de comunicar que está abalando a convicção dos velhos donos de galerias . Nós estamos trincando os muros dos museus . Quando eu falo da importância que essas novas gerações têm , eu falo do Denilson Baniwa , eu imagino a Daiara Tukano . Ela fez uma intervenção aqui em Minas Gerais , em um edifício de 28 andares , um mural com uma imagem poderosa . É uma intervenção no espaço urbano que está repercutindo como o maior mural de arte feito por uma mulher indígena no mundo , em critérios de extensão , dimensão e em qualidade . É uma obra que deveria ser levada para outros lugares do mundo , para além desse prédio aqui em Belo Horizonte .
O Jaider Esbell fez uma intervenção em um viaduto no centro de Belo Horizonte , o viaduto Santa Tereza , com duas jibóias . Uma instalação tão fantástica que chegou a provocar a ira do ( Jair ) Bolsonaro e da gangue dele aqui na Câmara Municipal de Belo Horizonte , onde um vereador fez uma proposta para retirar a obra dizendo que aquilo era coisa de chinês . Fake news é um vereador mineiro dizer que a obra de um artista indígena Macuxi é chinesa . É fake news ou então eles estão declarando que são burros convictos .
Com sua experiência na coisa pública , você considera possível ocorrer um amadurecimento das consciências via instituições democráticas , com a aplicação de políticas , a exemplo da ampliação do currículo formal escolar que já conta com disciplinas que ensinam e debatem a história dos negros ?
A minha experiência em política não é tão íntima do sistema público brasileiro , assim . Eu fiz uma intervenção nos debates da nossa Constituinte em 1987 e o fato de ter ajudado a incluir na nossa Constituição o capítulo dos Direitos Indígenas é mais relevante para minha compreensão do Brasil do que os dez anos em que eu assessorei o governo do estado de Minas na promoção da política pública para os povos indígenas . São coisas que não se comunicam diretamente . Mas aconteceram muitas coisas nessas três décadas que separam os debates da Constituinte do momento que estamos vivendo agora . A mais relevante é que nós passamos a integrar uma sociedade digital . A globalização nos botou dentro da web . E muitas coisas , muitas decisões , inclusive da própria administração , do Direito e da política , são feitas virtualmente .