Revista Amooreno EDIÇÃO 14 -MAR19 | Page 30

torna fácil esquecer o porquê dele estar nesse pedestal. Só os seus 35 anos à frente da Chanel são um feito por si só, o equivalente da moda a Isabel II e o seu mais longo reinado da história. Mas houve uma mulher que lhe torceu sempre o nariz e raramente lhe reconheceu mérito. A mãe, Elisabeth Bahlmann, nunca se interessou muito pelo trabalho de Karl. “Não quero ir ver as pessoas para quem o meu filho trabalha”, recontou Karl. Bahlmann nunca quis assistir a um desfile do filho e morreu em 1 978 sem nunca o ter feito. Tinha 81 anos. “A minha mãe costumava dizer- me: “Tu pareces comigo, mas não és tão bom como eu”. Outros tempos, outras formas de pensar”, justificou Karl. De Elisabeth Bahlmann, Karl herdou não só as feições, mas a longevidade e a capacidade de ser curto e grosso. E, aparentemente, frio. Nos muitos artigos de jornal, entrevistas, documentários e em toda a tinta que já correu com o seu nome, poucos ou nenhuns indícios surgiram de uma vida amorosa para além de Choupette, a gata siamesa com quem gostaria de casar, como anunciou ao mundo em 201 3. “Nunca pensei que iria apaixonar-se desta forma por um gato”, confessou Lagerfeld na introdução de “Choupette: The Private Life of a High-Flying Cat”, o livro sobre este amor pela gata com mais de 11 4 mil seguidores no Instagram. Foi sua companheira fiel e fotografou-a para inúmeras campanhas de moda, inclusive a capa da Vogue Brasil onde Choupette assume o protagonismo com Giselle Bunchen na edição de dezembro de 201 4. “O Karl não é apenas um dos nossos maiores e mais prolíficos designers, ele é também um linguista, um fotógrafo, um decorador de interiores, um colecionador, um realizador, um artista e um filantropo, e a lista não acaba aqui. Às vezes, pergunto-me se ele não é também um físico louco que descobriu uma forma engenhosa de acrescentar horas ao dia”, disse Anna Wintour sobre Karl Lagerfeld antes de lhe entregar o prêmio de Outstanding Achievement Award em Moda. Talvez a maior arte de Karl seja a da sobrevivência. Por ocasião dos seus 85 anos, o rosto do designer, a caricatura, a máscara que ele compôs tão eficazmente ao longo dos anos ganhara uma barba no verão. E quem sabe que mais truques não teria na manga. Mais uma vez, a sua vontade de ferro lá estava para recusar o que os outros consideravam sensato. Mas Karl acabaria por ser travado pela doença, que se arrastava já há algum tempo. Em janeiro deste ano, foi ruidosa a sua ausência no final do desfile de alta-costura da Chanel, apresentado na capital francesa. E os súditos do último dos kaisers da moda temeram o pior. Fim de festa, saudade eterna, para o artífice dos desfiles-espetáculo. 30 - REVISTA AMOORENO - MARÇO 2019