Relatório da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2015 | Page 70

RELATÓRIO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DA ALERJ | 2015 | 69 CDDHC: Quais são as principais denúncias que chegam na comissão? Ivanir dos Santos : Desrespeito, briga com crianças nas escolas, confusões e desentendimentos entre vizinhos e até casos de invasão de templos chegando a agressão física. Isso sempre ocorreu, mas agora está tendo reação. Somos pacíficos. Reagimos indo a delegacia prestar ocorrência mesmo sabendo que muitas vezes você não consegue fazer o registro na delegacia. Isso acarreta a subnotificação, porque impede a instalação de inquérito para denúncia ao Ministério Público. E quando há delegados que levam o caso adiante, acabam sendo perseguidos por esses grupos de fanáticos. Na audiência pública, eles foram com uma camisa dizendo: Bíblia sim, Constituição não. Isso em um Estado laico. O fanatismo é perigoso para qualquer grupo social. Esses grupos têm um poder político nessa cidade e no Congresso. Tem também as outras instâncias. Estamos diante de um Estado que é laico, mas a pessoa vai ser funcionário público e não se insere nessa prerrogativa do Estado. Usa a sua religião como caminho para construir benefícios. Tem juiz julgando ações a partir das suas concepções religiosas, tem promotor que faz denúncia a partir da sua ordenação religiosa, tem delegado que atua também a partir da sua concepção religiosa. Tem prédio público que tem culto e missa. Certa vez, entrei na Alerj e tinha aviso no elevador: Dia tal, horário x, culto no lugar tal. Do outro lado tinha o aviso da missa do padre. Agora, se eu chegar lá e tentar colocar um aviso lá dizendo: quarta-feira, a tal hora, sessão com a vovó Maria Conga, eu não vou poder não, vai poder? E não pode mesmo, porque o Estado é laico, o problema é que na prática ele não é. Ou seja: o culto a algumas religiões é permitido dentro de um prédio do Estado laico, outros não. CDDHC: Quais são os principais locais de agressões a terreiros no Rio de Janeiro? Ivanir dos Santos : Em algumas comunidades, porque justamente temos essa contradição de traficantes se dizerem evangélicos algumas vezes aliados com maus pastores. Isso é real. E temos que olhar como isso também é feito dentro dos presídios. Ocorre mais em área de periferia, mas isso não quer dizer que não aconteça nos grandes centros. Já tivemos ocorrência no Catete, porta da Zona Sul. O que chama atenção é o silêncio de setores progressistas com relação a esse tema. Ou seja, isso não é uma preocupação ainda, não é vista como prioridade na pauta partidária, porque a intolerância religiosa não está na macropolítica. Ocorre com grupos minoritários, mas quando ocorrer com o grupo católico, quando uma santa é quebrada, aí o clamor é maior. É como se existisse um consenso na sociedade ou preconceito de que é com “macumbeiro” e preto pode. Aliás, por conta da intolerância religiosa, o único momento em que um branco se sente discriminado é quando ele é praticante de religião de matriz africana. Ele sai com seu fio de cota e entra no ônibus e de repente ouve um “tá amarrado”. Então, a caminhada a favor da liberdade religiosa é isto: você vê várias pessoas brancas da religião matriz africana que vão para rua, ele assina a cultura religiosa de um povo, de uma identidade, de uma cultura que é negra e é africana. CDDHC: Então, a Lei que adota o ensino da história e cultura africana nas escolas de ensino fundamental e médio como obrigatório é um caminho para combater a intolerância? Ivanir dos Santos: Sim. Inclusive, a lei que é federal, em nenhum momento fala de religião, mas de cultura. Porém, tem professor que quando fala a palavra África, o menino evangélico já sai resmungando que isso é macumba. Ora, África é o berço