Relatório da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2015 | Page 116
RELATÓRIO DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DA ALERJ | 2015 | 115
eram destinados às unidades públicas para um número menor de presos. A principal
motivação para a privatização não tem sido a redução de custos, mas sim realizar uma
espécie de burla à lei de responsabilidade fiscal. Com a privatização, as despesas do
governo com custeio não aparecem.
CDDHC: Há transparência na gestão dos desses contratos?
José Jesus Filho: A ausência de transparência é a regra. É isso que tem garantido contratos ou prorrogação de contratos sem licitação e a permanência da mesma empresa
numa unidade por longos anos. Ao longo da sua execução, os contratos sofrem múltiplos aditamentos, o que aumenta a despesa originalmente prevista. Muitas vezes
temos acesso ao contrato, mas não temos acesso aos aditamentos. Outro problema
é que o Ministério Público não tem atuado para dar transparência a esses contratos.
Nem sequer instaura investigação para apurar a sua lisura.
CDDHC: O senhor apontou que nos sistemas estaduais onde existem unidades
privatizadas e públicas, estas acabam sendo prejudicadas porque a maior parte
dos recursos acaba sendo destinada às penitenciárias privadas. Por que essa diferença na destinação do dinheiro?
José Jesus Filho: Eu desconfio que há corrupção nesse esquema. Em um dos estados
que visitamos, havia oito unidades prisionais. Apenas uma era privatizada e abrigava 10% dos presos. No entanto, essa unidade recebia 40% dos recursos destinados
às unidades. Essa unidade era mantida como modelo, enquanto as demais estavam
sendo sucateadas.
CDDHC: A Pastoral apontou que sob a justificativa de manter a disciplina e evitar fugas, as empresas acabam violando direitos fundamentais dos presos. Que
violações são essas?
José Jesus Filho: As principais violações estão relacionadas às privações a que submetem os presos: proibição de leitura de jornais, de revistas, de assistir programação
televisiva livre – quando assistem, são programas religiosos – restrição de tempo de
recreio. As revistas são humilhantes e, algun s lugares, os presos são algemados nos
pés e nas mãos quando das visitas de seus familiares. A imposição de restrições torna
mais fácil para as empresas administrarem a prisão, de modo que tudo funciona segundo a conveniência da empresa.
CDDHC: Como os trabalhadores das unidades privatizadas não são concursados, há grande rotatividade. Quais os impactos dessa situação? Há preocupação
com treinamento?
José Jesus Filho: Esses agentes atuam em situação absolutamente precária e sem treinamento. Isso está na lógica do confinamento operado pelas empresas. Quanto menor o
contato com os presos, melhor. As prisões privatizadas acabam se tornando espaços da
indiferença. Nas entrevistas que fiz com agentes de unidades privatizadas, eles não têm
muita noção do que estão fazendo no local e é difícil iniciar até mesmo uma conversa
sobre os seus próprios direitos, quanto mais sobre os direitos dos presos.
CDDHC: Por que a gestão do sistema prisional não pode estar submetida à lógica
empresarial, de busca do lucro?