Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 30
2.3. Caso Cláudia Silva e a
infeliz reafirmação dos
autos de resistência
Eram cerca de 9h de um domingo, dia
16 de março, quando uma viatura do 9º
BPM (Rocha Miranda) descia a Estrada
Intendente Magalhães, no sentido Marechal Hermes, na Zona Norte do Rio, com
o porta-malas aberto. Depois de rolar lá de
dentro e ficar pendurado no para-choque
do veículo apenas por um pedaço de roupa, o corpo de uma mulher foi arrastado
por cerca de 250 metros, batendo contra o
asfalto conforme o veículo fazia ultrapassagens. Apesar de alertados por pedestres
e motoristas, os PMs não pararam. Um cinegrafista amador que passava pelo local
registrou a cena num vídeo.
A mulher arrastada era Cláudia Silva Ferreira, de 38 anos, baleada durante uma
troca de tiros entre policiais do 9º BPM
e traficantes do Morro da Congonha, em
Madureira, enquanto ia comprar pão. Em
depoimento à Polícia Civil, os PMs disseram que a mulher foi socorrida por eles
ainda com vida, e levada para o Hospital Carlos Chagas, em Marechal Hermes,
mas não resistiu. Já a secretaria Estadual
de Saúde informou que a paciente já chegou à unidade morta. Ela levou um tiro no
pescoço e outro nas costas. Dias depois,
a Polícia Civil informou que Cláudia foi
morta em função dos disparos pelos quais
foi atingida.
Esses são apenas alguns dos inúmeros casos
de “mortes em confronto” na lista do batalhão. Outras 57 pessoas morreram em condições semelhantes nos últimos dois anos
(2012 e 2013) na área do 9º BPM, que é
a 4ª com maior número de autos de resistência. De acordo com dados do Instituto
de Segurança Pública (ISP), o batalhão fica
à frente de outras 36 unidades do Estado.
Vale ressaltar que a bordo do veículo haviam
três policiais do batalhão que historicamente é apontado como um dos mais violentos
do Estado e cujos integrantes chegaram a
ser conhecidos como “Cavalos Corredores”
na década de 90 — época da Chacina de
Vigário Geral.
Três semanas antes da morte de Cláudia,
no dia 23 de fevereiro, outros agentes da
unidade já haviam se tornado centro de um
outro caso de violência policial: um jovem
inocente foi morto a coronhada em Campinho, na Zona Norte do Rio. Na ocasião,
quatro PMs foram afastados e presos internamente pela morte do adolescente, de
acordo com a corporação.
Antes disso, a morte de dois rapazes na
comunidade Bateau Mouche já tinha causado revolta em moradores. No início de
fevereiro, os jovens, que não tinham passagem pela polícia, foram baleados por
PMs do 9º BPM. Os assassinatos foram
registrados como homicídio em intervenção policial — antes chamado de auto de
resistência (morte em confronto com a polícia). Familiares garantem que a dupla não
tinha envolvimento com o tráfico e que as
armas encontradas ao lado das vítimas foram “plantadas”.
Dezessete bairros e cerca de 30 mil registros
de ocorrências por ano (desde furtos até
homicídios), segundo dados oficiais. Essa é
a realidade da região atendida pelo 9º BPM
(Rocha Miranda), onde a guerra do tráfico
de drogas faz moradores reféns. Apenas
em 2013, a região registrou média de 82
ocorrências por dia de acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP).
Conforme mencionado em relatórios e posicionamentos anteriores desta CDDHC, o
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