Relatório anual da Comissão de Direitos Humanos da Alerj - 2014 | Page 59
Iara Pinheiro
Vinícius Romão alega que o
negro é sempre visto
como o culpado
“Eu fui vítima de racismo”
A pele negra, o penteado black power e o racismo fizeram com que o psicólogo Vinícius
Romão, 27 anos, fosse confundido com o ladrão que havia roubado a bolsa de uma
mulher na Rua Amaro Cavalcanti, no Méier, em 10 de fevereiro deste ano. Ele voltava do
Norte Shopping, em Del Castilho, onde trabalhava, quando foi detido. Além da falta de
provas, o procedimento em que a vítima o reconheceu foi realizado sem obedecer às determinações da legislação penal. Vinícius ficou 16 dias preso na Casa de Detenção Patrícia
Acioli, em São Gonçalo.
O fato de o psicólogo ter trabalhado como figurante na novela “Lado a Lado”, da TV Globo,
em 2012, foi crucial para que fosse libertado. A mobilização de seus amigos e familiares nas
redes sociais e a atenção dada pela imprensa permitiram que as arbitrariedades cometidas
pela Polícia Civil fossem denunciadas.
CDDHC: Qual sua avaliação sobre a sua
prisão e a forma como você foi tratado
ao ser levado para a delegacia?
Vinícius: Por causa do erro de uma pessoa
que me acusou injustamente, fui levado
para a 25ª DP (Engenho Novo). Os meus
direitos não foram vistos e uma sucessão
de erros me levou à prisão. Vocês não sabem como é estar preso e não poder provar a inocência. Nem uma ligação pude
fazer. Não pude ligar para um advogado,
para meu pai ou para o meu trabalho.
Meu pai é tenente-coronel do Exército. Se
ele chegasse na delegacia com a carteira
de militar, ia fazer diferença? E por quê?
Por que ele tem autoridade? Perante a
lei, somos todos iguais. Então, o garoto
que cometeu o crime, que pensaram que
fosse eu, também não ia ter condições
de responder? Também não teria direito
a nada? Eu tenho nível superior, carteira
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de trabalho assinada, residência fixa, sou
réu primário, mas nada disso foi investigado. Quero saber o que o Estado faz hoje
para mudar essa situação. A polícia deveria proteger a população, mas isso não
aconteceu.
CDDHC: Você acredita que foi vítima de
racismo?
Vinícius: Sim, fui vítima de racismo. Eu perdoei a moça que disse que eu tinha roubado porque ela estava muito nervosa, tinha
acabado de ser assaltada. Mas foi racismo
porque os meus direitos como cidadão não
foram respeitados. Se o delegado tivesse
feito uma simples ligação para o meu trabalho, eu não teria passado pelo que passei.
As leis existem, mas quem deveria cumprir
não obedece. Se o delegado cumprisse a
lei, eu não teria sido preso. Tudo isso dá
a entender que o negro não presta, que é
sempre visto como o culpado.