RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Resumo Executivo | Page 36
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o estado não consiga lidar e precise da atuação federal. A violência no carnaval
de 2018 foi o estopim para justificar a medida interventiva, nas alegações do
Presidente Michel Temer. Entretanto, dados oficiais do Instituto de Segurança
Pública não identificaram mudança entre o carnaval de 2018 e o anterior. 23
Após 08 meses de intervenção, as mortes praticadas pela polícia já somam 1151.
Maior do que todo o ano de 2017, no qual foram contabilizadas 1127 mortes por
intervenção policial, olhando apenas para o período entre fevereiro e outubro de
2017, foram 819 mortes, um aumento de 28% num número que já era absurda-
mente alto. 24 Houve também significativo aumento do número e tiroteios. Foram
7457 tiroteios, entre fevereiro e outubro [em 2017, foram 4695 no mesmo perí-
odo]. Tiroteios realizados em áreas de favela submetendo a população a maior
risco e impedindo inclusive a frequência dos alunos as escolas. Em 2017, foram
167 tiroteios próximos a escolas. Em 2018, esse número subiu para 463 e basta
olhar as 05 escolas mais afetadas para se verificar a divisão territorial das ações
– Cidade de Deus, Parque São José, Vidigal, Rocinha e novamente Vidigal. 25
Escolas foram usadas como barricadas para proteção policial, colocando crian-
ças e adolescentes em risco extremo. Há ainda denúncias de estupro, invasão
de domicílio, subtração de bens e muita violência – desde o tapa na cara até a
morte – nos relatos colhidos de moradores de favela pela Defensoria Pública do
Estado do Rio de Janeiro. 26
Em tempos sombrios, é preciso dizer o óbvio. Toda essa violência praticada pe-
los agentes públicos é incompatível com um Estado Democrático de Direito. Não
há Estado de Direito sem instituições capazes de assegurar o cumprimento das
Constituições e das leis. O Brasil está vinculado a uma Constituição que proíbe
a pena de morte e a tortura, assegura o devido processo legal, a ampla defesa
e reconhece como fundamental a dignidade da pessoa humana. Não existe de-
mocracia sem respeito as minorias – ou como dizia Lélia Gonzales, as maiorias
silenciadas. 27
Quando se demonstra, como o fizemos, o quanto todas as políticas de segu-
rança pública do Rio de Janeiro nos últimos 30 anos, foram sempre voltadas a
prática de atitudes violentas por parte do Estado – de modo direto ou por meio de
conluio com milícias e grupos de extermínio – é incompreensível a persistência
de um discurso que sustente o uso ainda maior da força como o pregado pelo
Governador eleito. Segundo ele, “O correto é matar o bandido que está de fuzil.
A polícia vai fazer o correto: vai mirar na cabecinha e... fogo! Para não ter erro”. 28
A Subcomissão da Verdade na Democracia atuou no sentido de reconstruir a me-
mória da violência de Estado no período democrático justamente por entender a
importância da sociedade ser informada sobre o quão grave, seletiva, sistemá-
tica e sistêmica essa violência tem sido e que ela não produz maior segurança
para ninguém. Muito pelo contrário, ela condena parte da população do Rio de
23 - https://www.revistaforum.com.br/nao-houve-explosao-de-violencia-no-carnaval-do-rio-garante-isp/
24 - Fonte ISP. Disponível em: www.isp.rj.gov.br
25 - Ver Observatório da Intervenção. Disponível: https://drive.google.com/file/d/1FvcNTZhWhJb-xNMjC-
3fEuP6sroUZOW5s/view Acesso em: novembro de 2018.
26 - Disponível em: http://sistemas.rj.def.br/publico/sarova.ashx/Portal/sarova/imagem-dpge/public/arqui-
vos/Circuito_Favelas_por_Direitos_relatorio_parcial.pdf Acesso em: novembro de 2018.
27 - BARRETO, Raquel de Andrade. Aquela neguinha atrevida: Lélia Gonzalez e o movimento negro
brasileiro In Revolução e Democracia (1964-...) organizadores Daniel Aarão Reis e Jorge Ferreira. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2007, (Coleção: As Esquerdas no Brasil; volume 3).
28 - Disponível em: https://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/wilson-witzel-defende-tiro-na-cabeca-de-crimino-
sos-com-fuzil-01112018 Acesso em: novembro de 2018.