RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Resumo Executivo | Page 26

26 sabilidade em relação aos crimes de tortura relacionados à prática de agressão física ou psicológica de maneira específica. Diante do quadro de violência exposto ao longo do relatório tornou-se possí- vel afirmar que o atual regime formalmente democrático, instaurado no Brasil com a promulgação da Constituição Federal de 1988, não só não rompeu com as históricas violações de direitos humanos praticadas pelo Estado, como as intensificou. Olha, eu acho que a prática da tortura na democracia, ela segue a norma histórica da tortura no Brasil, que sai um pouco da norma do período da ditadura militar, essa é a visão que eu tenho...Que a tortura no Brasil ela é naturalizada, institucionalizada, contra al- guns segmentos da população, que é o segmento negro, perifé- rico ou considerado desviante, travestis, gays, essa é a norma desde o período colonial até os dias de hoje. Acho que o único período de exceção, que a tortura foi um pouco mais expandida, foi o período da ditadura militar, mas assim, eu acho que hoje no período democrático, a tortura voltou ao normal dela na história brasileira, que é a tortura contra pessoas historicamente em situa- ção de massacre pelo Estado. Que é a população negra, popula- ção privada de liberdade, freguesa do sistema carcerário, enten- deu? Nessa população aí a tortura é completamente naturalizada pelos agentes estatais, por elas próprias, elas não se veem como vítimas de tortura, isso é do cotidiano dessas pessoas...Você fa- lar sobre isso com essas famílias, eles não se enxergam como vítimas de violações de direitos humanos. A gente tem a maior dificuldade, às vezes, pra trazer um familiar pra ter assistência ju- rídica num processo de responsabilização (do Estado), porque os familiares não enxergam os seus filhos, os seus parentes, como vítimas de tortura, né...(eles tem) medo, e não tem nenhuma pro- teção pra pessoas interessadas em denunciar prática de tortura, programa de proteção à testemunha praticamente acabou...En- tão, o que eu vejo hoje é que, na democracia, a prática de tortura continua plenamente em funcionamento, mas ela voltou a ser diri- gida contra o público natural que ela sempre foi dirigida no Brasil. (Testemunho Lívia Casseres, Defensora Pública)