RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Resumo Executivo | Page 24

24 absoluta em relação à redução da maioridade penal. A especial situação de violação experimentada por mulheres e meninas encar- ceradas, decorrente de suas necessidades subjetivas e biológicas específicas e de uma invisibilidade e abandono decorrentes de um machismo estrutural, foi outro importante ponto que apareceu em vários depoimentos coletados. Ques- tões como a realização do acautelamento de meninas de forma quase total por agentes masculinos; a ausência de insumos básicos e específicos de higiene; a prática de vigilância e castigos arbitrários relacionados à sexualidade das mu- lheres presas; as violações relacionadas à gravidez e à maternidade no cárcere, entre muitas outras, foram fortemente afirmadas nos testemunhos. No escopo dos temas invisibilizados pelo sistema prisional, foi afirmada também a grande preocupação em relação às violações sofridas pelas populações LGBTQIs. A pesquisa se debruçou, também, sobre outros espaços ou práticas de privação da liberdade, em geral não discutidas ou debatidas apenas em campos políticos muito específicos. Foram coletados testemunhos e analisados casos que dizem respeito ao cumprimento de medidas de segurança; aos manicômios e ao pro- cesso da Reforma Psiquiátrica; às comunidades terapêuticas; e às políticas de internação compulsória, implementadas a partir da justificativa de combate ao crack. Apesar de ter sido uma diretriz central na construção deste relatório, a prática de tortura pelo Estado não se restringe ao tema da privação da liberdade. No que tange a atuação policial, especialmente às violações praticadas pela polícia militar, o acesso a dados e relatos foi extremamente difícil. As agressões e tor- turas praticadas majoritariamente pela polícia militar, mas também pela polícia civil, nas favelas e periferias, raramente são denunciadas, implicando em uma extrema subnotificação; além de não haver qualquer política institucional efetiva para a produção e sistematização de dados nesse campo. Como na privação da liberdade, no que se refere à violência praticada pelas polícias, também é impos- to um alto risco de retaliação por parte dos agentes do Estado contra as pessoas que decidem denunciar os casos de abusos, agressões e torturas. Como é no- tório, tal risco de retaliação significa, muitas vezes, um risco à própria vida e à vida das pessoas próximas ao denunciante. Apesar da prática reiterada de maus tratos e torturas pela polícia ser de notório conhecimento público, não verifica- mos qualquer esforço significativo das instâncias do poder público, responsáveis pela investigação e judicialização de casos, no sentido de prevenir e combater essas práticas. Nos testemunhos e documentos acessados sobre esse tema foi constatada a permanência de técnicas da ditadura ainda atualmente: a aplicação de choque nas vítimas, com a utilização de armas supostamente menos letais; a utilização de afogamento; o uso de saco para sufocamento; a prática de abusos sexuais; a prática de espancamentos que muitas vezes ocasionam a morte da vítima de tortura; entre outras. As graves violações aos direitos humanos relacionadas à tortura e à privação da liberdade, na atualidade democrática, se relacionam com a política de combate às drogas, com a criminalização da pobreza, e com o racismo institucional. A atu- al política criminal, a atuação das polícias, do Ministério Público e do Judiciário são responsáveis pela manutenção de práticas violentas históricas do Estado brasileiro. Uma vez que o atual quadro de violência institucional é amplamente conhecido, podemos afirmar que existe uma a ação intencional do Estado (no âmbito dos poderes executivo, legislativo e judiciário, bem como do Ministério