RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Resumo Executivo | Page 20
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retamente vinculado às políticas de segurança; ou como produto da disputa por
mercados clandestinos, abrangendo toda a pirâmide das corporações.
Os efeitos dos trinta e cinco anos de democracia sobre as execuções sumárias
no Rio de Janeiro tornaram este tipo de violação mais discreta. Não no sentido
de sua profusão, quem sabe mais grave hoje que nos anos de chumbo, mas em
razão de mecanismos e práticas institucionais que procuraram, ao longo desse
período, subtrair e mascarar sua ilegalidade e imoralidade até torná-las parte
“aceitável” das políticas de segurança pública no Rio de Janeiro. Nesse sentido,
à histórica ausência de controle externo da atividade policial por parte do Minis-
tério Público, desde que recebeu tal atribuição na Carta de 1988, se somaram
instrumentos que, pouco a pouco, foram destituindo de cidadania e humanidade
o extrato mais baixo e mais numeroso da população. A premiação por bravura,
os mandados de busca e apreensão coletivos, o enquadramento arbitrário de
moradores no crime de associação ao tráfico, a Súmula 70 do Tribunal de Justiça
do Estado do Rio de Janeiro – utilizada para prender e condenar suspeitos tendo
por base apenas o testemunho do policial –, bem como, evidentemente, os autos
de mortes em decorrência de intervenção policial, constituem exemplos claros
desse contexto de cerceamento.
Como foi dito anteriormente, as execuções e chacinas não são fatos isolados.
Os cadáveres que ela produz são políticos, no sentido de que a continuidade
histórica desse tipo de violação necessita de uma rede de interações envolvendo
atores e instituições eminentemente políticos. Apesar de ser ela quem aperta o
gatilho, a corporação policial não é a única instituição herdeira dos padrões au-
toritários, discriminatórios e violentos que vigiam durante a ditadura militar e que
permanecem hoje como referência de ação.