RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA AS EXECUÇÕES SUMÁRIAS NO RJ | Page 30

Adivinham, portanto, de justiçamentos baseados em noções pessoais de limpeza social; da encomenda, por terceiros, em especial comerciantes, de assassinatos de pequenos criminosos; da contratação de matadores para a eliminação de adversários e desafetos; e, por fim, de inúmeros acertos de contas e queimas de arquivos de interesse dos próprios justiceiros ou de mandantes diversificados. Quando o tráfico de drogas emerge como uma força bélica no estado, ou é elevado a tal categoria, outras formas de chacinas e execuções começam a incrementar um contexto por si só já alarmante. A ascensão dos grupos armados que negociavam drogas nas favelas ensejou uma disputa em vários pontos da cidade entre bicheiros e traficantes. Nessa nova guerra urbana a polícia era leal aos bicheiros e mascaravam seu suporte aos antigos parceiros com operações de combate ao tráfico. No Rio de Janeiro do final dos anos oitenta, a Rocinha era, ao menos na capital, o ponto de disputa de maior ferocidade entre esses grupos. No final de agosto de 1987, a polícia militar fez uma grande operação na favela, que resultou na prisão do traficante Dênis. A truculência policial não se resumiu aos disparos a esmo durante a incursão, mas se abateu sobre inúmeros moradores, espancados e torturados, que fizeram um protesto duramente reprimido pela polícia em plena estrada Lagoa-Barra. No início de janeiro de 1988, as investidas policiais contra a Rocinha incrementam. Em menos de vinte e quatro horas agentes da Delegacia de Vigilância Sul [DV-Sul] realizam quatro blitz na favela, com alto índice de violência contra os moradores. A ação rendeu a exoneração do delegado Campello, responsável pela operação. Nesse mesmo dia, conforme denunciado por um morador que não quis se identificar, O Largo do Boiadeiro – centro nervoso da favela onde funciona o ponto de jogo do bicho – está cheio de homens armados e policiais da DV-Sul, que protegem esse grupo a serviço da contravenção [JB, 15/09/87].