Projeto Cápsula Aranha, a artista | Nnedi Okorafor | Page 9
do nariz, conseguiria acreditar nisso. O violão exis-
tia há décadas e ainda cheirava a madeira recém-
-cortada, como se quisesse contar sua história por-
que apenas ele podia fazer isso.
Sem o violão do meu pai, eu não existiria. Quan-
do ele era jovem, costumava se sentar na frente das
casas no fim do dia e tocar para todo mundo. As pes-
soas dançavam, batiam palmas, fechavam os olhos
e ouviam. Os celulares podiam tocar e as pessoas os
ignoravam. Um dia, fora minha mãe quem parou
para escutar.
Eu tinha o costume de ficar observando suas mãos
ágeis e seus dedos longos quando ele tocava. Ah, as
harmonias. Ele conseguia tecer qualquer coisa com
sua música: arco-íris, sol nascente, teias de aranha
cintilando sob o orvalho da manhã. Meus irmãos
mais velhos não tiveram interesse em aprender a
tocar. Mas eu tive, então, meu pai me ensinou tudo
o que sabia. E agora eram meus os dedos longos que
agraciavam as cordas. Sempre fui capaz de ouvir a
música e meus dedos se moviam ainda mais rápido
do que os do meu pai. Eu era boa. Boa, mesmo.
Mas me casei com aquela droga de homem.
Andrew. Então, eu só tocava nos fundos de casa.
Longe dele. Meu violão era minha fuga.
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