Projeto Cápsula Aranha, a artista | Nnedi Okorafor | Page 10
Naquela noite fatídica, eu estava sentada no chão
em frente ao duto de combustível que atravessava
o quintal de todo mundo. Minha aldeia era uma de
extração de petróleo, como a aldeia onde eu cresci.
Minha mãe morou em uma dessas antes de se casar,
e a mãe dela também. Somos Gente do Oleoduto.
A avó da minha mãe era famosa por ficar deita-
da no duto que atravessava a aldeia dela. Ela ficava
assim por horas, ouvindo e imaginando que fluidos
mágicos corriam por aqueles tubos de aço largos,
que nunca tinham fim. Isso, claro, foi antes dos Zum-
bis. Eu ria. Se ela tentasse se deitar em um duto hoje,
seria brutalmente assassinada.
Enfim, quando me sentia mais triste que o nor-
mal, eu pegava meu violão, ia lá para fora e me
sentava em frente ao oleoduto. Sabia que estava
flertando com a morte ficando perto assim, mas
quando eu estava daquele jeito, não me importava
mesmo. Na verdade, aceitava de bom grado a pos-
sibilidade de ter minha vida encerrada. Foi um mi-
lagre meu marido não ter estraçalhado meu violão
em uma das fúrias etílicas. Eu certamente teria me
atirado no oleoduto se tivesse feito isso. Talvez fos-
se por isso que ele preferia estraçalhar meu nariz
ao meu violão.
5/29