Pro RJC_236_DIGITAL | Page 8

8 CAPA Abril 2020 | Justiça & Cidadania n o 236 “Não é dado a nenhum governante o poder de desprezar a vida” Entrevista com a Presidente reeleita do Instituto dos Advogados Brasileiros, Rita Cortez Da Redação N o final de março, Rita Cortez foi reeleita presi- dente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), a mais antiga entidade jurídica das Amé- ricas. A não apresentação de chapa concorrente indica- ria, segundo a dirigente, que “independentemente do pluralismo de ideias, os advogados querem manter o IAB no caminho da defesa dos valores democráticos e do aprimoramento do ordenamento jurídico”. Nessa entre- vista concedida à distância, durante a quarentena do novo coronavírus, ela apresenta sua visão sobre como o Instituto deve cumprir estes objetivos, bem como se posicionar contra as fake news e em defesa da educação, da cultura e das prerrogativas dos advogados. Revista Justiça & Cidadania – Quais são as metas da nova gestão? Rita Cortez – Manter o IAB como referência jurídica no País e somar esforços com outras respeitáveis ins- tituições e entidades de representação, para atuar na defesa da soberania e da legalidade constitucional e democrática do Brasil. Queremos também executar alguns poucos pontos da plataforma eleitoral de 2018 que não foram implementados. São eles: a ampliação de benefícios sociais; a revisão do estatuto e regimento interno; a legitimação ativa do IAB para atuação judicial direta calcada nos pareceres técnicos das comissões temáticas; a efetivação dos cursos de extensão e pós- graduação através da Escola Superior do IAB, e a participação ativa na Conferência Nacio- nal da Advocacia. RJC – Qual papel o IAB pode cumprir na crise do novo coronavírus? RC – Como instituição jurídica com 176 anos de existência, que nunca deixou de atuar historicamente ao lado do povo brasileiro nos momentos mais difíceis e sofridos, é nosso dever colaborar para que haja a supe- ração da crise sanitária e social trazida pelo avanço do covid-19 com o menor número de vítimas. A mensagem do IAB é a de que precisamos, prioritariamente, salvar vidas, endossando e difundindo todas as recomen- dações e orientações dos órgãos mundiais de saúde e autoridades sanitárias compe- tentes. Nossas comissões temáticas já estão trabalhando nas Medidas Provisórias 927 e 936, que versam sobre alterações e restri- ções trabalhistas. Apreciaremos também a MP 928, que suspende os prazos para aten- dimento aos pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação. O IAB, por meio da Comissão de Direito Penal também subscreveu, com outras entidades, carta aberta ao STF con- clamando uma série de providências diante do alastramento do covid-19 no sistema prisional. Mais recentemente, elaboramos, em tempo recorde, parecer sobre o PLS nº 1.179/2020, do Senador Antonio Anastasia, que cria, para funcionamento no período da pandemia, o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET). RJC – Como têm se saído os governantes brasileiros na resposta à epidemia? RC – Não é dado a nenhum governante o poder de desprezar a vida humana. Um chefe de Estado não pode, sob pena de imputação da responsabilidade civil, administrativa e criminal, desorientar a população com falsas notícias ou dados inverídicos, em um momento tão grave e agudo de alastramento da pandemia, indo de encontro às orien- tações dos órgãos mundiais de saúde. Na opinião de especialistas da área penal, chega a ser criminosa a letargia do Governo em sancionar medidas paliativas à crise já aprovadas pelo Congresso. RJC – Considera factível a proposta de isolamento vertical defendida pelo Presidente da República, dadas as condições demográficas e de saneamento básico da população brasileira? RC – O isolamento horizontal é a recomendação dos cientistas, médicos e profissionais de saúde que lidam com a pandemia. O presidente parece querer defen- der o indefensável ao propor o isolamento vertical. Para além da desigualdade social absurda, a pande- mia, infelizmente, expõe os graves problemas exis- tentes no Brasil, notadamente aqueles verificados no sistema de saúde e no saneamento básico. 9