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O Risco da Poesia Cada vez mais observamos uma tendência na vida social de separar adultos de crianças, nada bom para a transmissão da memória cultural de nosso país. Temos muito a aprender com nossos modelos pedagógicos, “mestres sem mestrados”, aqueles das manifestações populares, os mestres das folias de reis, das congadas e moçambiques. Os melhores mestres são aqueles que reconhecem que há sempre algo a conhecer. Estes sabem muito bem qual é o verdadeiro sentido da educação, que passa pelo respeito ao tempo do outro, pela beleza de suas bandeiras, pela força de suas crenças e pela delicadeza de seus sentimentos. “Poesia é brincar com palavras.”. José Paulo Paes “Poesia se faz com palavras, não com idéias.”. Stéphane Mallarmé Todo professor deve lembrar, no momento do estabelecimento do “contrato pedagógico” (Aquino, Julio Groppa) com seu aluno, que não deve faltar em sua aula, a cláusula da alegria e O encantamento das palavras não está apenas em seu significado, em seu aspecto semântico (relativo ao conteúdo), pois elas possuem som e forma e isso demonstra que sua significação do divertimento. O divertimento, o encantamento, a verdade, não são sinônimos de indisciplina ou falta de respeito. “Como incutir o respeito, sem encarnar este valor no dia-a-dia? Diz-se, às vezes, que transcende aos limites da lógica e das regras preestabelecidas pela língua e deságua na analógica (jogo de semelhanças formais). Nem sempre a linguagem tem valor utilitário, a simples necessidade de comunicar e se ensina-se o que se é” (Perrenoud, Philippe). A conquista do respeito na relação entre professor e aluno, entre pais e filhos, se dá à medida que o exercício da justiça e do pensamento, de fato, acontece. “A razão só inicia o trabalho do pensamento quando sentimos que pensar é um bem ou uma alegria, e ignorar, um mal ou fazer entender, de emitir uma mensagem específica - ela tem uma dimensão lúdica e sensorial. Quando, por exemplo, cantamos uma música em outro idioma sem saber o significado das palavras,expressamos emoções e sensações que não estão no domínio do rigor do pensamento lógico, experimentamos algo que está à flor da pele, que passa desapercebido às couraças da uma tristeza” (Chauí, Marilena). Felizes todos aqueles que ao passar pela vida despistaram as amarguras, tapearam a tristeza, brincaram de cabra-cega com a esperança e protegeram a alma e o coração do esfriamento, razão, e vai provocando nossos sentidos e nosso âmago. É divertido. E assim observamos, em muitas cantigas populares que, muito provavelmente, foram criadas por crianças. Léxica e semanticamente não encontramos significado lógico nas palavras, conservando-se aquecidos para fazer surgir a criança de cada um. Este livro e cd são presentes elaborados por diversas mãos e diversos dons, por crianças de todas as idades, e oferecidos a todos que sentem saudade da própria infância, porém crescem acreditando num futuro ainda melhor; para aqueles que querem dar, a cada dia, um SENTIDO mas elas cumprem uma função lingüística importante na brincadeira e, por que não dizer, na melodia e no ritmo da música. O que significa ora, zuiz truiz truiz truiz, ora zaiz traiz traiz? Logicamente, nada. Analogicamente, muito: soa bonito, é engraçado, e por que não cantar? As palavras nessas cantigas buscam analogias com a música, se fundem com o canto. novo a sua própria existência. Nisso as crianças vencem de longe os adultos: o uso radical da linguagem, de forma livre Jacqueline Baumgratz e portanto libertária – e não utilitária. E ela não busca justificar-se ou inventar significados inexistentes: ela simplesmente se diverte cantando o presente e quando canta, todo um universo vai surgindo em seu imaginário; significados efêmeros, então, povoam a mente da criança, criados por ela sem preocupação com as normas da língua. Portanto, brincar com a linguagem é inusitado, divertido e exercita intensamente o ato criativo. Aqui chegamos a um ponto que me parece essencial no contato com a poesia, seja criando ou 8 9