Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia | Page 9

Fica claro, diante das características da dinâmica utilizada pelo perpetrador do abuso sexual, como sedução, ameaças ou uso de força, a revelação da situação abusiva torna-se um momento de importância e de medo para as vítimas.

Em nossa prática, em alguns casos, há revitimização da criança ao quebrar o silêncio, quando os responsáveis, com intenção de obter a confirmação e, principalmente, se é verdadeiro o abuso, utilizam atos invasores ao próprio corpo da vítima, com exame da região genital e anal ou, ainda, o uso de ameaças de surras ou castigos, caso não falem a verdade, ou com crianças muito pequenas que perguntam para mãe porque não utiliza a mesma metodologia de higiene empregada, por exemplo, pelo genitor. Esta última, na verdade, não se caracteriza a intenção de revelar, mas a afirmação de que algo está acontecendo.

Adultos podem revitimizar crianças e adolescentes ao buscarem uma maneira de ter certeza do ocorrido e até mesmo para poder protegê-los, ou, ao contrário, podem acabar não acreditando no relato da vítima e tão pouco tomando as medidas protetivas cabíveis, muitas vezes com a ideia que a criança esquece e se não falar sobre o tema não haverá consequências presente ou futuras para a mesma, mantendo o complô do silêncio.

A revelação feita por crianças pequenas torna-se um momento crucial se o abuso aconteceu em função de trocas de presentes ou guloseimas. Em qualquer caso, a vítima já revelou o abuso para outras pessoas em outras ocasiões.

O abuso sexual de crianças e adolescentes tende a afetar o desenvolvimento tanto da criança como do adolescente apresentando, em alguns casos, efeitos mínimos ou podem apresentar graves problemas no âmbito emocional, social e psiquiátrico. Sendo que uma das consequências mais preocupantes é a possibilidade de se tornar um agente agressor sexual de outras crianças ou adolescentes. Tanto assim, que temos exemplo em nosso quadro de usuários adolescentes que, ao mesmo tempo em que são vítimas de abuso sexual, foram também acusados da prática da agressão sexual em crianças pequenas. Outra possível sequela deixada pelo abuso é ser revitimizado em outros momentos da vida por outras pessoas.

A literatura e nossa experiência apontam que crianças e adolescentes podem desenvolver quadros de depressão, ideias suicidas, transtornos de ansiedade, alimentares (bulimia e ou anorexia), dissociativos, hiperatividade e déficit de atenção e transtornos de personalidade boderline, sendo citado também como frequente o transtorno do estresse pós traumático (DUARTE & ARBOLEDA , 1997).

A mãe tem sido apontada como figura de destaque nesse processo de revelação, uma vez que como figura afetiva e de referência é a ela que a criança ou adolescente tende a revelar a situação abusiva. Deste modo, as reações da família, principalmente da mãe, frente à revelação são um importante fator para o desenvolvimento de sintomatologias psiquiátricas e alteração do comportamento na vítima.

PATHOS / V. 01, n.01, 2015 08