Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 77

A presença de perspectivas reais enquanto deslocamento da energia psíquica, pode ser entendido então como uma saída de saúde, principalmente em tempos de pandemia. Porém, quando corremos o risco de termos nossos corpos afetados pelo COVID-19, acreditamos que o reprimido poderia ficar impossibilitado de ser sublimado, pois o gesto criativo poderia ficar interrompido, não possuindo contornos estruturantes capazes de devolver ao sujeito uma satisfação e alcance psíquico enquanto gesto criativo.

C) “A convocação do inconsciente para o enfrentamento”

Parece que de alguma forma, o sonho desses participantes denota a necessidade de enfrentamento. O pesadelo, sendo entendido aqui como uma espécie de sonho que não deu certo, no sentido de possibilidade de realização do desejo, chega convocando o sujeito para o enfrentamento do cotidiano. Nos sonhos os conflitos e a necessidade de encarar as situações se torna mais frequente. Mudanças de conteúdo onírico foram percebidos por parte da amostra pesquisada, denotando que com a pandemia o inconsciente passa também a ser mais acionado e exigido:

Mudou o foco, agora sonho que estou sempre em discussão política. Já "estive" na Amazônia brigando com Salles. Sonhei com a minha chefia, ou que voltei a trabalhar. O último foi alguém me chamando para socorrer minha mãe, que mora próximo a mim e sozinha (sic).

Acordo muitas vezes com vontade de chorar. Noites agitadas, com alguns sonhos sem sentido... Sonho estar perdida (sic).

Como podemos ver nos trechos acima, situações conflitantes, fantasias de onipotência, senso de responsabilidade interpelam e convocam parte dos sujeitos, ao que a possibilidade de sonhar e “resolver” conflitos se transforma no terror de um pesadelo sem possibilidades de resolução.

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PATHOS / V.. Especial , Set. 2020 76