Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 52

Na categoria “D” as crianças enfatizam o verdadeiro poder nos elementos e características humanas, bem como nos recursos da natureza. A valorização dos sentimentos humanos, como amor, força e cuidado e dos recursos naturais como, fogo, gelo, oceano, entre outros, são valorizados pelas crianças participantes. O que nos chama a atenção é que mesmo diante de um cenário político que revela insegurança e pouca preocupação com os recursos naturais, mesmo a sociedade vivendo momentos de extrema violência humana e social, envolvendo intolerância, racismo, LGBTfobia, mortes e violação dos direitos fundamentais, o universo da infância parece estar parcialmente protegido, evidenciando esperança ao acreditar que o poder de solucionar os conflitos ainda pertence ao universo humano, desde que se faça bom uso dos recursos naturais.

É relevante apontar que nenhuma criança, sem exceção, apontou diretamente qualquer tipo de esperança no universo político acerca da solução da pandemia, nem mesmo de caráter fantasioso. A única saída foi ocupar o lugar da presidência e resolver por ele. Para as 154 crianças, o cenário político atual parece não possuir relevância, importância, destaque, visibilidade e proteção, podendo gerar de alguma forma, desconfiança, desamparo e abandono.

Foi visto também que o elemento agressividade, salvo manifestações extremas, pode ser extremamente benéfico. Em situações conflitantes como a pandemia, tal aspecto pode ficar mais evidente no universo das crianças, sendo essa característica, entendida e reconhecida também como elementos e recursos internos de enfrentamento, o que possibilita aos pais e responsáveis a condição de não patologizar tais sentimentos de raiva e ódio frente as situações vividas.

Concluímos, também, que a possibilidade de uso do brincar e da fantasia na tentativa de elaboração dos conflitos, condiciona e encaminha a criança para um lugar de saúde, nos ofertando ao mesmo tempo a possibilidade de irmos ao encontro de seu universo interno e acompanhá-la em tal brincadeira. Poder matar simbolicamente o inimigo proporciona a criança a continuidade da vida, assim como a esperança e a manutenção de sobrevivência, tanto subjetiva como social.

Σ

PATHOS / V. Especial , Set. 2020 51