Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 44

Uma suposição aqui levantada seria uma aproximação a vivência do complexo de édipo, em que seriam necessárias identificações, disputas e rupturas, ao que para isso, elementos fantasiosos de morte e aniquilamento necessitariam ser vividos imaginativamente. De forma resumida, assim como é saudável para a criança poder matar simbolicamente o pai na relação edípica, seria saudável poder também matar o coronavirus e aquilo que ele representa enquanto interdito. De forma provocativa e, porque não debochada, temos a tendência a achar que não são somente as crianças as que se aproximariam de tal desejo de morte, destruição e aniquilamento do vírus e da quarentena.

A figura de Deus, baseado na fé, também aparece nesse discurso, dando espaço para a força e o poder do sagrado no enfrentamento da pandemia. Por outro lado, parece que somente a figura de Deus, etérea e abstrata, é quem poderia em tom de milagre, acabar com o vírus.

Em dado momento do discurso, as crianças também reúnem todos os super-heróis, como numa espécie de força tarefa, como se somente a partir da união de poderes o vírus poderia ser combatido e derrotado. O lugar de fala ganha destaque nesse discurso, porém, para tanto, parece que a infância só poderia ser ouvida se possuísse superpoderes: “Isso é claro, se eu fosse heroína porque daí todos iriam me ouvir” (sic).

Como diria Corso e Corso (2006): “Graças a essas mentes onívoras foi possível constatar que ainda há lugar para novas e velhas personagens, cada uma com uma missão a cumprir” (p.304). Dessa forma, somos extremamente gratos a todos os tipos de super-heróis e super-heroínas, sejam elas Mulheres-maravilhas, Batmans, Elsas, entre tantos outros anônimos e fantasiados. Somos gratos por proporcionam as crianças capacidades de identificação e elaboração de conteúdos internos infantis, nesse caso, especificamente, conteúdos vinculados ao combate do COVID-19.

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PATHOS / V. Especial , Set. 2020 43