Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 35

Em parte, podemos entender então que tal movimento seria parcialmente saudável, quando tais mecanismos de defesa são bem-sucedidos na tarefa de proteger o indivíduo daquilo que o angustia e assusta. Contudo, tais movimentos defensivos poderiam também transformar-se em prejuízo para o indivíduo que dele utilizar, tendo que pagar um preço alto demais em seu psiquismo, como por exemplo, conteúdos reprimidos que se tornariam potenciais sintomáticos futuros, como por exemplo, o excesso de controle a serviço da angústia, essa por vezes não dominada pela criança.

Diante disso, muitos pais e responsáveis teriam a tendência em poupar ao máximo seus filhos dos conflitos do dia a dia. Porém, quando o ambiente oferta respaldo e suporte através das figuras de confiança, sejam pais, responsáveis, professores ou educadores, a criança tem a chance de viver seus medos acompanhadas e dessa forma “O desprazer original da ansiedade vira o grande prazer de uma ansiedade encarada de modo bem-sucedido” (BETTELHEIM, 1980, p. 153).

Mediante a função defensiva descrita acima, somos remetidos ao questionamento se tais crianças não estariam sendo invadidas e atravessadas em seu imaginário com preocupações que talvez não necessariamente deveriam fazer parte de seus cotidianos de maneira tão enfática, exigindo de suas defesas egóicas um dispêndio de energia psíquica além do esperado e suportado.

A presença somática do outro, em seu corpo e em seu espírito, acompanha a criança pelos caminhos dos quais não se pode fugir. O segredo então não seria negar a realidade, pelo contrário, trilhar tal percurso de sofrimento seria importante, desde que acompanhado. Isso não quer dizer sobrepor a vivência da criança, roubar seu espaço de existência, representações e significações, mas sim se fazer presente ao seu lado com o intuito de alcançar o entendimento de sua vivência.

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PATHOS / V.. Especial , Set. 2020 34