Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume Especial COVID-19 | Page 31

Processo pelo qual o sujeito procura apresentar uma explicação coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral, para uma atitude, uma ação, uma ideia, um sentimento, etc., cujos motivos verdadeiros não percebe; fala-se mais especialmente da racionalização de um sintoma, de uma compulsão defensiva de uma formação reativa (LAPLANCHE e PONTALIS, 2001, p. 423).

Parece denotar, em alguns momentos, que a fantasia desse grupo de crianças falha perante a concretude visceral que o atravessa e os impacta, como por exemplo, no momento em que apontam as tentativas cientificas infrutíferas perante a aquisição de uma solução imediata e eficaz, o que tal ausência de perspectiva concreta e segura poderia gerar nas crianças uma sobrecarga emocional que os convoca ainda mais a tentar desenvolver maior racionalização, como uma espécie de compulsão defensiva na busca de soluções, por vezes, adultizadas e intelectualizadas.

Podemos observar que ao tentarem se apropriar do vírus, as crianças revelam o impasse de se depararem com a polaridade existente entre o mundo externo, entendido como ameaçador e perigoso, e o interno, vivido como seguro e protegido por suas fantasias de controle. Essa seria a possibilidade de levar o conflito para um campo de batalha gerido pelo imaginário infantil, no qual o vilão (coronavírus) estaria sob seu julgo e, portanto, passível de controle.

A criança saudável não consegue tolerar inteiramente os conflitos e ansiedade que atingem seu ponto máximo no auge da experiência instintiva. A solução para os problemas da ambivalência inerente surge através da elaboração imaginativa de todas as funções; sem a fantasia, as expressões de apetite, sexualidade e ódio em sua forma bruta seriam a regra. A fantasia prova, deste modo, ser a característica do humano, a matéria-prima da socialização, e da própria civilização (WINNICOTT, 1990, p 78).

Ainda nesse sentido, a auto responsabilidade se mostra presente no discurso das crianças, denotando uma ética infantil que nos convida indiretamente ao enfrentamento, direcionando-nos para uma tomada de consciência enquanto ser social e participativo no combate a doença, isto é, parte da resolução do conflito está em nosso reconhecimento enquanto seres coletivos e correlacionados.

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PATHOS / V.. Especial , Set. 2020 30