Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume 12 | Page 42

“Minhoca, minhoca me dá uma beijoca,

Não dou, não dou, então eu vou roubar!

Minhoco, minhoco você é muito louco,

Beijou o lado errado, a boca é do outro lado!”

No percurso pela educação infantil me deparei com inúmeras experiências compostas por canções, danças e histórias. Embora sejam tratadas com naturalidade pelos colegas, algumas me tocaram com estranheza pois ofereciam às crianças conteúdos que me pareciam um tanto inadequados, em destaque aqueles reforçadores da lógica machista vigente em nossa sociedade.

Enquanto professora implicada no aprendizado de crianças na fase da Educação Infantil e encontrando eco nas atuais discussões sobre machismo e seus efeitos tóxicos sobre a saúde e o social de mulheres e homens, senti-me convocada a atuar sobre esse tema com minhas crianças. "Ah, mas criança é despida de todo e qualquer preconceito", essa é a frase que mais escutava e ainda escuto como justificativa para que não se trabalhe essas questões em sala de aula com crianças tão pequenas.

Em contramão a essa resistência, acredito na possibilidade de uma Educação Infantil para os Direitos Humanos, a qual pode ser oferecida às crianças de maneira apropriada a seu desenvolvimento. Destaco uma música infantil de domínio público. Nela, o minhoco quer a todo custo beijar a minhoca, mesmo ela dizendo não. Em uma versão mais atualizada ocorre ao contrário. Na recusa do pedido o minhoco entende que não pode ter aquilo conforme seu desejo, tampouco pelo uso da força. Não preciso dizer o quanto isso é significativo, em termos de desenvolvimento cognitivo-emocional, no sentido da criança perceber o limite do outro e de seu desejo, ou seja, NÃO é NÃO.

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PATHOS / V. 12, n.02, 2020 41