Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume 12 | Page 51

Isso é extremamente insuficiente para pensar a tristeza, a depressão e o sofrimento. Meu ponto de partida é pensar que o indivíduo sofre a partir das relações que ele estabelece com o mundo e nossa forma de sociabilidade é essencialmente atravessada pela violência e pela dominação. Temos aí, então, a dimensão de um sofrimento que não é apenas individual, mas diz respeito a uma intersubjetividade, que faz com que seja um sofrimento ético. Quando falamos de ética, estamos falando de intersubjetividade. Entretanto as relações não são neutras, elas são relações atravessadas pelo poder, consequentemente são relações políticas. O sofrimento que decorre dessas políticas é um sofrimento ético-político. Esse é o principal recorte para se pensar esse sofrimento que resulta em suicídio. Uma coisa óbvia, que serei bem tautológico agora é: o indivíduo que completa o suicídio, que apresenta comportamento suicida, está em sofrimento. Isso é a nossa premissa inicial. A grande questão é perguntar que sofrimento é esse? Faço esse recorte de pensar no sofrimento ético-político. Mais uma pontuação, eu insisto, a violência não é um desvio de percurso da nossa socialização. Normalmente, quando se pensa sobre o que é violência, onde ela se manifesta, costuma-se ter modelos apresentados na mídia, de que violência é homicídio, é latrocínio, é roubo de carro, é assalto, etc. E perde-se a dimensão da violência que ocorre na intimidade dos lares, na chamada violência intrafamiliar que atravessa todos nós, todas as famílias, em maior ou menor grau, mas que atravessa a nossa sociabilidade, porque ela é extremamente naturalizada. A grande questão é pensar o quanto esse tipo de violência, que resulta em sofrimento ético-político, leva à negação desse indivíduo, o impossibilita de ser e existir segundo a sua própria maneira, segundo as suas propriedades, segundo a maneira como ele quer ser e existir. Esse é o grande ponto para pensar o sofrimento ético-político. O quanto esse tipo de sofrimento é carregado de uma história de violência específica, na posição social de onde aquele indivíduo está. Lembro que no ano de 2017 tivemos o caso de uma mulher que estava dormindo dentro do ônibus, aqui na Av. Paulista, e acordou com um homem ejaculando em cima dela.

PATHOS / V. 12, n.02, 2020 50

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