É possível que experiências de perda e luto relacionadas à transição de gênero incluam a percepção de um paradoxo presença/ausência da pessoa que se identifica com um gênero diferente daquele que lhe foi atribuído ao nascimento (Sá, 2019; Whalig, 2015). A vivência de um paradoxo presença/ausência, por parte de familiares, representa um período de ambiguidade na percepção da identidade de gênero da pessoa trans.
Período marcado pela confusão e sensação de que a pessoa antes conhecida está presente, ao mesmo tempo que não está, o que implica em adaptações na imagem anteriormente construída em relação ao gênero. Por serem a transição social e médica de gênero processos visíveis, é possível que sentimentos de perda sejam vivenciados por familiares de pessoas trans, especialmente quando é exigido algum tipo de explicação do familiar a terceiros, situação muitas vezes carregada de sentimentos como vergonha e culpa.
As perdas também podem estar presentes no que diz respeito à perda da sensação de segurança diante da transfobia, ameaça à saúde derivada de intervenções médicas, como a hormonização e cirurgias e à readaptação de expectativas, planos e sonhos para aquela pessoa, como “ver a filha se casar de branco” e essa filha se identificar com o gênero masculino. Aqui, ficam claras as influências de padrões normativos baseados na percepção de gênero nas perdas vivenciadas. Metaforicamente, o movimento de atualizar a imagem de uma filha por um filho, por exemplo, indica a necessidade de “dizer adeus” a uma pessoa para acolher alguém que se apresenta de forma diferente da reconhecida desde o nascimento (Sá, 2019).6
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PATHOS / V. 07, n.01, 2021 62