Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia Volume 07 | Page 60

Para Kenneth J. Doka, o gênero é um fator que exerce influência no luto, porém, não é o único: deve-se considerar aspectos individuais e culturais, como o desenvolvimento do papel de gênero ao longo do tempo e a influência do machismo na expressão da dor e do luto “masculino”. No livro Grieving Beyond Gender: understanding the ways men and women mourn4, uma revisão de Men Don’t Cry, Women Do: transcending gender stereotypes of grief5 (Martin e Doka, 2000), Doka e Martin (2010) elaboram um modelo conceitual de estilos de luto instrumental e luto intuitivo.

O luto instrumental, predominante entre o gênero masculino, postula que o homem enlutado expressa a dor da perda de forma majoritariamente cognitiva e comportamental, buscando a elaboração do luto por meio da execução de tarefas, por exemplo. Já o luto intuitivo, predominante entre o gênero feminino, refere-se a um estilo de expressão do luto por meios afetivos. Haveria ainda um terceiro padrão, representado pela união destes dois estilos.

Entretanto, os autores percebem que há muitas mulheres que expressam o luto de forma instrumental e homens de forma intuitiva, concluindo que a vivência da perda e do luto é tão individual quanto a impressão digital, e o gênero, apenas um dos aspectos multifatoriais que influenciam a experiência de enlutamento. Ainda assim, a análise pode ser considerada simplista, do ponto de vista dos estudos e perspectivas mais contemporâneas a respeito do gênero.

Nota-se, sobre esta questão, uma importante influência do modelo hegemônico de identidade e comportamento historicamente descrito como masculino. A masculinidade tóxica demarca as características e papéis sociais atribuídos ao homem, aprisionando-os à prescrição de uma subjetividade que supervaloriza a força física, indisponibilidade afetiva e emocional, competitividade, virilidade, e tantos outros atributos que levam sofrimento e violência para a sociedade como um todo, inclusive para os próprios homens – se é que existe uma definição completa o suficiente para responder à pergunta “o que é ser um homem?”.

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PATHOS / V. 07, n.01, 2021 59