Pathos: revista brasileira de práticas públicas e psicopatologia 6º Volume | Page 28

Apolo buscava constantemente uma referência, mas nunca encontrava sua “morada”. Construir casas bem que poderia servir ao propósito. Seu sonho de ser engenheiro, implicando “ser alguém”, sua dedicação aos estudos e a aspiração por encontrar algo que pudesse defini-lo enfim desmorona. Sua identidade torna-se uma busca fadada ao insucesso. Seu RG serviria como prova para “ser alguém”, seu histórico escolar traria sua “verdade histórica” no papel, traduzindo-se como o “seu valor” (sic.).

A sequência de perdas acompanha o surto psicótico, fazendo eclodir seus delírios paranoicos e o conduzindo à impotência frente ao seu próprio destino, resignando-se diante da vida e preferindo a morte. Ao ser convocado a simbolizar suas perdas - a namorada, seu trabalho e, porque não, a sua história de vida - Apolo não suportou, pois para suportar tais perdas fazia-se preciso a referência paterna, o que conforme a teoria psicanalítica faz menção à instância terceira, ao Nome-do-Pai e, portanto, à metáfora paterna.

A não-inscrição do Nome-do-Pai determina a psicose como forma específica de constituição psíquica situada num tempo lógico em que os referidos tempos edípicos não resultam no complexo normativo da castração. A Lei encontra-se, em termos subjetivos, comprometida, restando ao sujeito, a sua crença delirante. Por isso, talvez, ele precisava concretamente de seus documentos, pois poderiam servir de aporte simbólico.

Podemos, neste momento, apreender alguns de seus questionamentos: “Afinal, que marca me define?”, ou “Eu não sei quem sou” (sic.). Cabe igualmente questionarmos: “Como usar outro nome no próprio corpo que não o dele?”.

Apolo ensina para aquele que quer aprender quando nos permite olharmos para quem nós também somos, enquanto profissionais, enquanto instituição. Há um sentido em suas ações, em sua linguagem. Ele diz tanto e tantas verdades que, para alguns, é melhor contê-lo. Sedar sua verdade. Anestesiar a ele e a si.

Como é possível notar, o tema da identidade permeia as questões acima levantadas, revelando-se em sua centralidade no campo do sofrimento psíquico deste sujeito. A psicose atesta a falência das referências simbólicas que são, justamente, aquelas que determinam a realidade para um neurótico. Em outros termos, o que nos define enquanto sujeitos de profissão, de estilo de vida, de inserção comunitária, de geração e filiação são todas referências simbólicas que nos permitem viver na ilusão de sabermos quem somos.

Na psicose, ante a não-inscrição do Nome-do-Pai, resta aos fenômenos psicóticos (como o delírio e a alucinação) fazerem suplência ao Pai. Como no caso de Apolo, ao se deparar com perdas que lhe demandavam fazer uso de recursos simbólicos – identitários – ele perdeu o chão e dirigiu-se a uma ponte. Não lhe era possível.

"O maior problema

com relação a esta questão é que não temos permissão

dos chefes de

biqueiras para

que os usuários se aproximem das

ações sociais."

PATHOS / V. 06, n.04, 2018 27

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